A falta que faz a verdadeira liderança. Toda a história da humanidade, em seus momentos de maior transformação, sempre trouxe à tona grandes exemplos de lideranças que deixaram sua herança como inspiração para várias gerações, por séculos. Dos geniais pensadores gregos como Aristóteles, Pitágoras, Sócrates a gênios como Isaac Newton, Galileu Galilei, Leonardo Da Vinci e Louis Pasteur, Graham Bell, Santos Dumont, Henry Ford, Albert Sabin, Albert Einstein, Walt Disney, Mahatma Gandhi, Martin Luther King, Steve Jobs…
Nos anos 80, destaco o trio que estancou a espiral sem volta da Guerra Fria : Margaret Thatcher, Ronald Reagan e o Papa João Paulo II. Trio que o mundo teve a sorte de ver atuar juntos, desbancando o império do mal, reduzindo os impostos na economia, abrindo caminho para mais um novo ciclo de crescimento histórico no mundo (o Brasil como exceção). Sem esses visionários não teríamos vivido o boom da internet.
Antes deles, vale lembrar do lendário Winston Churchill, o homem que salvou o mundo da hecatombe nazista. Em um dos bombardeios alemães às ruas londrinas, o então primeiro ministro britânico presenciou a destruição de um hotel. Vejam, em plena Segunda Guerra Mundial, Churchill estava caminhando a pé pela cidade-alvo, podendo ser atingido como o empreendimento que teve o edifício completamente destruído. Ele narra que encontrou o proprietário, a mulher e o único funcionário do hotel aos prantos. No trem de volta à sua casa, ditou uma carta para o ministro das finanças decretando que todos os prejuízos causados pelo fogo inimigo ficassem por conta do Estado, e que se pagassem indenizações integrais em caráter imediato. “Assim”, escreveu Churchill, “o ônus não recairia apenas sobre aqueles cujas casas e estabelecimentos comerciais fossem atingidos, mas seria equanimemente distribuído sobre os ombros da nação.”
Neste atípico e constrangedor 2020, termos inéditos, como quarentena, pandemia, lockdown, coronavírus, #fiqueemcasa, #usemáscara, incorporaram-se ao vocabulário de toda o planeta ao confinar literalmente bilhões de pessoas ao interior de seu habitat, conforto à parte, independentemente das condições sociais de cada um.
Passados mais de quatro intermináveis meses de nossa existência, em que diariamente buscamos respostas, insights, âncoras, possibilidades, esperanças para visualizar dias melhores, com melhores condições para si, sua família, a comunidade e a sociedade em que se vive, por incrível que pareça, constatamos que a realidade nua e crua é a que está aqui. A vida continua, claro. A criatividade e a flexibilidade de adaptação dos humanos são incríveis e encorajadoras.
Evidentemente que esse mundo totalmente digital, ancorado pelo Zoom e Teams que toda hora falham, com sua instabilidade peculiar, não é o que queremos, nem o que precisamos. A empatia e a vontade de se ver, se relacionar, cuidar despontam como imperativos. Embora estejamos todos conectados com os quatro cantos do planeta, nunca nos sentimos tão isolados, e a necessidade de contatos reais interpessoais nunca foi tanta e tão intensa. Os algoritmos não nos ouvem nem nos unem. Fazem, sim, da nossa experiência o seu império.
Quando tentamos buscar no passado como os líderes superaram as grandes crises que já assolaram a humanidade e as guerras, que são parte integrante da história, vemos como estamos ao sabor dos ventos das big techs e nada mais. A bem da verdade, a grande parte da humanidade representada pela ascensão dos millennials, essa geração tipicamente digital, que ascendeu com o boom das gigantes de tecnologia, nunca vivenciou guerras, crises ou adversidades, como nossos pais passaram, por exemplo.
Pior, nem se lembram (não têm curiosidade, tampouco idade para lembrar) dos tempos críticos da Guerra Fria que marcou a existência dos boomers, a geração do pós-guerra, justamente a geração que mais criou riquezas na história, e da Geração X, nascida em meados dos anos 60. O mundo sempre foi bipolar. Estados Unidos e sua fantástica máquina de produção de riquezas, inovações, tendências, cultura e modismos de um lado e, de outro, a fracassada União Soviética, representante do regime mais atroz que já existiu, o comunismo e sua máquina de produção de guerras, expansão territorial e extermínio de opositores e rebeldes.
Ali, todos conviviam com a ameaça de uma iminente e eventual guerra atômica. Até o dia em que o tal “império do mal” ruiu com a festejada queda do Muro de Berlim em 1989 e a história “acabou”, conforme vislumbrava Francis Fukuyama. Até o dia em que a história voltou, com a queda das duas torres do World Trade Center, em 2001.
E é nesse ponto que constatamos a ausência da criação e formação de lideranças à altura desse mundo tão complexo. Onde temos exemplos de referência real e inspiradora e que não sejam factoides gerados pela imprensa, por interesses momentâneos. Basta relembrarmos nos anos 2000, aqui no nosso Brasil, as tais lideranças consagradas e marcadas por diversos reconhecimentos que notabilizaram ícones da corrupção deslavada que varreu o País…
E, no resto do mundo, onde surgiram lideranças de fato? Boomers à parte, com vários deles em processo de aposentadoria, os representantes da Geração X não conseguiram exercer a sua natural liderança diante da rapidez com que os tais nativos digitais avançaram e se apoderaram de um suposto conhecimento tecnológico para assumir o protagonismo, que se constata agora, bem precoce. Bolo tirado do forno antes da hora.
O mundo político se perdeu até pela falta de adversidades reais e começou a avançar para pautas de comportamento, desafiando as tradições de família e os valores, introduzindo posições que atritam naturalmente o histórico mais conservador da humanidade. Nasce uma outra polarização, como contrapartida, alavancada pela imprudência da rede social do Mark e seu fakebook, que a cada post demanda um like ou dislike.
Não há maior adubo ao fomento da polarização. E onde se destacam mentes iluminadas com argumentos que permitam novas avaliações e caminhos, que convençam pelas palavras sábias? Nada. Apenas assistimos a uma turba de desenvolvedores de algoritmos impondo a sua vontade por porcarias dispensáveis que roubam nosso tempo e invadem nossa privacidade a cada novo Tik Tok.
Qual é o valor agregado para a sociedade, a não ser aos autoproclamados “novos sábios” do influenciamento digital e seus animadores de plateias seguidoras, que desviam olhos e ouvidos para imprestáveis dicas ou narrativas ladras de tempo? Para que aprender, estudar, pesquisar, entender a história para escrever e fazer o futuro? Cadê os líderes que irão nos inspirar? Influenciadores, deslumbradas, celebridades, políticos, autoridades? Cada um tirando o seu pequeno proveito pessoal e se autopromovendo. Onde estão os criadores de verdadeiras riquezas? Não aqueles milionários momentâneos que atingiram o nirvana ao lograr vender o mais novo app de plantão.
Vejam um exemplo simples e símbolo clássico da degradação de um marco do capitalismo, Nova York. Há exatos 30 anos, a cidade era uma autêntica Gotham City, com gangues, violência recorde, insegurança na maior parte da cidade. Locais nobres como a Broadway, a 42, ou mesmo a Quinta Avenida traziam sérios problemas para o pedestre. Andar a pé nessas ruas à noite era uma aventura similar a fazer o mesmo pelo centro de cidades como São Paulo ou Rio de Janeiro.
Quando chegou no fundo do poço, o nova-iorquino elegeu como prefeito Rudy Giuliani – que não existiria sem a revolução de Reagan e que ficou conhecido como “xerife” que recuperou a cidade, tornando-se mundialmente conhecido pelo slogan “tolerância zero”. Graças a ele, a cidade se reergueu e atraiu milhões de turistas do mundo inteiro, para andar pelos quatro cantos da cidade, desbravando tudo, dos melhores restaurantes do mundo a shows e lojas para todos os estilos, justificando a fama de cidade que nunca dorme.
Bastou uma geração desdenhar de todas essas vantagens e riqueza proporcionadas pela meteórica valorização imobiliária, advinda da revitalização de áreas dominadas pelo crime organizado, pelas drogas e pela prostituição, para arranha-céus modernos, entretenimento e serviços para que esse cenário se desfigurasse. Quem teve o prazer de conhecer a metrópole mais segura dos Estados Unidos guarde na lembrança. A administração liberal, politizada, inconsequente e descompromissada do prefeito atual, Bill de Blasio, alicerçado por uma geração de millennials sem conexão com aquele passado, trouxe de volta a insegurança e a criminalidade de outrora. E isso num processo crescente anterior à crise da pandemia. A falta de atenção da polícia aos pequenos delitos, ao contrabando, à venda de produtos falsificados e até às drogas em locais populares trouxe a permissividade de volta à cidade que era o sonho dos consumidores. O pesadelo atual foi maximizado pelos protestos de junho, as badernas descontroladas, a quebradeira do comércio e as lojas da Quinta Avenida e SoHo de tal forma que o inacreditável aconteceu. Desvalorização radical dos preços dos imóveis, debandada geral dos bilionários para os balneários e as praias. E a cidade parou. Gotham City voltou para delírio do Batman, o famoso homem-morcego…hilário, se não fosse desolador.
Cadê os líderes que resistirão a entregar o mundo aos algoritmos?
