As primeiras impressões quando começamos a andar em Tel Aviv, em Israel, não justificam a fama da cidade, verdadeiro ícone de um país que é reconhecido como um dos mais ricos, valiosos e impressionantes polos globais de produção de inovação. Ao contrário da arquitetura impecável e característica de metrópoles europeias como Amsterdã, Madri ou Berlim, Tel Aviv é algo relaxada. Cidade litorânea, combina casas e sobrados debruçados uns aos outros enquanto arranha-céus despontam velozmente no horizonte. A onipresente Uber funciona de modo pitoresco: só conecta passageiros com… táxis(!) e, por incrível que pareça, não responde pela tarifa – que pode ser combinada, algumas vezes, diretamente com o motorista. As agências bancárias nos levam a algum ponto entre as décadas de 70 e 80, repletas de guichês de madeira e ambiente sisudo. Mas essas são características naturais de um país que produz inovação não exatamente para si mesmo, mas para o mundo. Com pouco mais de 8,9 milhões de habitantes espalhados por 20.700 m², Israel combinou, de modo bem similar, todos os elementos capazes de formar um ecossistema de inovação vencedor: capital intelectual de alto nível, atividades de pesquisas e desenvolvimento espalhadas em universidades de ponta e grandes multinacionais, exército poderoso, mercado investidor maduro e líquido, com venture capitals – VCs – anjos, fundos e incentivo de políticas públicas que facilitam o ingresso de capitais e a abertura de novos negócios. Mas o segredo de Israel não está apenas na presença desses elementos, mas na forma com que eles se combinam para gerar modelos de negócio que possam ganhar tração globalmente.
AS BASES DA CULTURA DE INOVAÇÃO: SOBREVIVÊNCIA E SEGURANÇA
Segundo Yoav Fisher, head de Inovação para Saúde do Instituto de Inovação de Israel, há dois fatores-chave que explicam a produção de inovação em Israel: “o primeiro é a cultura da necessidade. O país foi criado em uma área literalmente desértica; não havia nada aqui há cem anos, quando as pessoas começaram a ocupar a região. Então, desde o princípio, as pessoas tiveram de criar tudo do zero: agricultura, água, comida, um mecanismo de sobrevivência. O segundo fator foi o exército. A importância de preservar fronteiras, diante de inimigos espalhados pelas fronteiras, condicionou todos a pensarem em sistemas, táticas e tecnologias de segurança e monitoramento”. Quando essas tecnologias essenciais, de segurança e de suprimento, se combinaram, um olhar empreendedor rapidamente percebeu que elas teriam alcance global. O mercado israelense é modesto, razão pela qual não há grandes redes varejistas no país (Super Pharma, de farmácias e AM:PM, de supermercados, grandes players locais, são modestíssimos varejistas sob qualquer comparação com outras redes globais), e, por isso, “olhar para fora” foi uma condição necessária para desenvolver negócios e captar divisas para movimentar a economia. Por outro lado, Israel rapidamente tornou-se um destino para políticas de apoio à pesquisa e ao desenvolvimento de multinacionais, a partir da força do capital intelectual. O país sempre se dedicou a formar muito bem os quadros. E dinheiro nunca faltou, tanto para estimular a educação quanto para apoiar a ciência. Estes fatores tiveram formidável encaixe no fim dos anos 70. A revolução da informática e, posteriormente, da internet, com o nascimento da era digital, foi de encontro a essa cultura voltada para o conhecimento, a pesquisa e a solução de problemas.
O estudo “State of Innovation”, da PwC, revela o poder da inovação em Israel: são US$ 674,00 de investimento per capita em inovação, o mais elevado do mundo (os EUA, por exemplo, alcançam apenas US$ 401,00 per capita, em um distante segundo lugar. A China, segunda economia, mal investe US$ 50,00 per capita). Em proporção do PIB, o pequeno estado judeu investe incríveis 4,3% do PIB em inovação, também número 1 global; é o segundo no ranking global em companhias de cibersegurança, e sedia mais de 6.600 startups, concentração 14 vezes a verificada na Europa (em comparação, o Brasil contabiliza pouco mais de 10 mil, com uma economia muitas vezes maior). Esse número alcança incríveis US$ 6 bilhões, mais de duas vezes o investimento registrado no Canadá (US$ 2,9 bilhões ou US$ 78,00 per capita). Não por acaso, há 536 multinacionais de 35 países com atividades em Israel. Dessas empresas, 57% desenvolvem PoCs (Proof of Concepts – Provas de Conceito ou Pilotos) regularmente no país.
PERSISTÊNCIA: A CULTURA DA SEGUNDA CHANCE
Yoav Barel, CEO da iniciativa Chatbot Summit, startup de eventos globais focada na disseminação de sistemas de concierge, atendimento e serviço por voz, ressalta outro aspecto cultural: o israelense nunca desiste, e sempre está à procura de soluções para problemas reais, existentes e profundamente humanos: “se existe um problema real, eu preciso usar todos os recursos que tenho à mão para encontrar uma solução. É diferente de outras culturas que sempre pedem por mais recursos, mais insumos e que se colocam em zona de conforto, sem oferecer soluções a partir do que já está disponível”. O CEO também destaca que o país funciona como uma colmeia, na qual todos os empreendedores atuam do mesmo modo sistemático e exercitam múltiplas habilidades. Dessa forma, sempre é possível encontrar alguém com quem dividir a resolução de um problema ou a criação de um projeto. E esse “alguém” conhece outra pessoa que pensa e age do mesmo modo ou sabe de outra pessoa com o mesmo perfil. Essa proximidade é a base da formação de diversas pequenas colmeias, nas quais empreendedores diligentemente se dedicam a resolver problemas com enorme precisão, foco e uma propensão a escalar soluções, ideias, inovações e empresas globalmente.
Um bom exemplo desse método deu origem à Riskified, uma empresa que funciona como uma plataforma de redução de riscos e fraudes para varejo e e‑commerce. Max Admoni, diretor de Parcerias da empresa, conta que os cofundadores, Eido Gal e Assaf Feldman, tiveram a ideia de criar uma solução rápida, instantânea, para avaliar o potencial de pagamento dos clientes, com 100% de garantia para os negócios, reduzindo a zero os riscos para os e‑commerces. Segundo Max, o volume de fraudes no mercado global totaliza US$ 48 bilhões/ano. Mas o mercado representado pela aversão a fraude, ou seja, de negativas de crédito e venda, atinge mais de US$ 300 bilhões/ano, ou seis vezes mais. Assim, a Riskified enquadrou o problema real e desenvolveu uma solução voltada para um mercado maior. “A maior parte dos sistemas existentes é ‘score based’, baseado em pontuação atribuída de acordo com regras estáticas, com moderação humana para aprovar ou declinar transações. Isso não é assertivo, pois cria falsos positivos. Por isso, muitos sites dos EUA não aceitam cartões internacionais porque não conseguem validar transações, ao contrário da Amazon, que aceita e valida cartões de praticamente qualquer país”. A Riskified desenvolveu um sistema de validação que usa IA para qualificar o cliente e a transação. Os modelos de machine learning são tão confiáveis que a empresa oferece 100% de garantia para todos os pedidos aprovados.
O MÉTODO ISRAELENSE DE CRIAR INOVAÇÃO
• EMPREENDEDORES DE ALTO NÍVEL – CONEXÕES EM REDES INSTITUCIONAIS
— EXÉRCITO, LABS DE MULTINACIONAIS, UNIVERSIDADES, GOVERNO
• ENFOQUE EM UM PROBLEMA DE GRANDE ESCALA
• PERSISTÊNCIA NA BUSCA PELA SOLUÇÃO DE MAIOR VALOR E AMPLITUDE
• CAPTAÇÃO DE INVESTIMENTO PARA LANÇAMENTO NO MERCADO DOS EUA
• PROJEÇÃO PARA O MERCADO EUROPEU E, DEPOIS, PARA MERCADOS EMERGENTES
FATORES DE INDUÇÃO DA CULTURA DE INOVAÇÃO
• DNA DE INOVAÇÃO – NECESSIDADE DE SOBREVIVÊNCIA E SEGURANÇA
• PERSISTÊNCIA E CRENÇA EM SEGUNDAS CHANCES
• ATRAÇÃO PELO RISCO
• ESPÍRITO DE COLMEIA – COMPARTILHAMENTO DE IDEIAS E INICIATIVAS EM REDE
• OBJETIVIDADE
• CONFRONTO LEAL COM A LIDERANÇA – ABERTURA PARA EXPOSIÇÃO DE IDEIAS
• VISÃO GLOBAL
TÁTICAS DO ECOSSISTEMA
• INCENTIVO A P&D – GOVERNO ESTIMULA INVESTIMENTOS NO EXÉRCITO, NOS LABORATÓRIOS DE MULTINACIONAIS DE TECNOLOGIA E NAS UNIVERSIDADES
• CONSTRUÇÃO DE ALIANÇAS E PARCERIAS LOCAIS E GLOBAIS PARA ACELERAR NEGÓCIOS
• CADEIA DE INVESTIMENTOS ABUNDANTE – MAIOR NÍVEL DE INVESTIMENTO PER CAPITA