
A OMNICANALIDADE PHYGITAL
Nos últimos anos, empresas avançaram na direção dos canais digitais e indicaram que chatbots e mídias sociais poderiam substituir o telefone na preferência do consumidor. Então, veio a pandemia e o futuro virou o presente. Dezenas de milhões de pessoas adotaram essas inovações tecnológicas. As pessoas ficaram encantadas com a novidade, mas viram que sentiam falta de algo. Faltava ir a um restaurante ou shopping center. Havia a necessidade de tocar, perguntar e provar o objeto de consumo.
No fim, o consumidor recuou, mas aprendeu uma lição. Ele não abre mão da empatia, mas agora terá um aliado dentro da sociedade de consumo: o mundo digital.
Omnicanalidade básica
Em outras palavras, no próximo ano, veremos um forte processo de massificação de omnicanalidade nas relações de consumo. No entanto, esqueça o formato que você aprendeu até agora. Estamos diante de uma ressignificação dessa ideia que surgiu a partir da urgência gerada pela pandemia e a necessidade de acertar o curso do relacionamento com o cliente para um momento pós-pandemia – e que gerou um novo anormal.
A ideia é que viveremos uma omnicanalidade phygital. “Omnicanalidade não será tão romântica como se pregou até aqui. Na verdade, ela vai estar ancorada sobre os canais-base”, afirma Daniel Domeneghetti, consultor, CEO da Dom Strategy Partners e responsável pelo estudo “Setor de Contact Center e CPOs 2019 a 2024: perspectivas setoriais” presente neste anuário.
De acordo com esse estudo, os canais básicos são e‑mail e telefone. No próximo ano, é bem provável que a mídia social seja o mais novo integrante do canal básico por diversos motivos, mas, principalmente, pela disponibilidade (ele não tem custo monetário, muito embora exista a contrapartida do uso de dados pessoais e custo menor para adaptação de times de relacionamento (muita gente já se habituou a usar o Facebook ou o WhatsApp).
• Multicanalidade formada por canais básicos ou mais comuns nas empresas (e‑mail, telefone e mídias sociais) e atendimento em loja.
• É uma mistura de digital com físico.
• É uma fase intermediária de uma omnicanalidade digital.
• Surge da confiança do consumidor por canais tradicionais (telefone e loja) e da descoberta pelo atendimento em canais digitais.
• A integração ocorre por meio de soluções de CRM.
Outro estudo, desta vez produzido pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), departamento do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), ligado ao Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), é ainda mais categórico em dizer que voltaremos ao consumo físico, porém com uma certa “pegada” digital no nosso comportamento.
O levantamento chamado Painel TIC COVID-19, que ouviu 2.627 pessoas entre os dias 23 de junho e 8 de julho deste ano, afirma que 66% dos usuários de internet compraram produtos ou serviços pela Internet, proporção que era de 44% em 2018 – ano da última pesquisa similar. Além disso, triplicou a proporção de usuários que fizeram pedidos de refeições por meio de sites ou aplicativos: em 2018, foram 15%, proporção que atingiu 44% durante a pandemia.
Por outro lado, a mesma pesquisa mostra que apenas uma minoria (5%) dos usuários pretende comprar exclusivamente on-line após a pandemia. Na verdade, a maioria (41%) pretende retomar o hábito de consumo em lojas físicas e pela internet, ou seja, empresas precisarão estabelecer uma comunicação que seja igual nos diferentes canais.
Cansa só pedir por aplicativo
O estudo do Cetic não aponta um motivo para esse comportamento do consumidor. Um deles é até óbvio. A realidade é que, por mais que tudo tenha se tornado mais dinâmico com a digitalização, o excesso de automação tem como consequência a falta de estímulos físicos, que também é cansativa.
Com o cliente em busca de contato, mas ainda inseguro com a pandemia, o volume de ligações para os canais de atendimento aumentou, mas nem todas as empresas, com quadro reduzido, deram conta desse aumento de demanda. Surgiu então outro fator: a disponibilidade das empresas.
“As empresas não estavam tão preparadas para o atendimento em outros canais que não o de voz, o que causou um descontentamento com a qualidade dos serviços”, diz Alberto Ferreira, CEO do Grupo Connvert. “Os canais digitais foram uma opção para quem estava com uma plataforma omnichannel, pois conseguiram criar jornadas de qualidade no atendimento e gerar boas experiências. Quem não estava preparado e se aventurou, gerou atendimentos fragmentados e confusos”, afirma.
Leonardo Sanchez, presidente da Nice Brasil, confirmou uma percepção bem parecida com o estudo do Cetic. Houve uma forte oscilação no uso de canais durante a pandemia. No primeiro mês, após o distanciamento social, a empresa registrou uma queda de 50% na quantidade de ligações e, ao mesmo tempo, percebeu uma grande procura por canais digitais. Meses depois, a realidade já é diferente. O volume nas mídias sociais e mensagerias já diminuiu.
“Os novos canais que foram abertos ou promovidos durante a pandemia continuam funcionando mesmo após a normalização dos atendimentos nos canais tradicionais. Atualmente, o consumidor tem acesso a serviços digitais em todas as áreas. Isso faz com que as empresas que não estiverem preparadas para o omnicanal corram o risco de serem deixadas de lado pelo consumidor”, opina o presidente.
Alberto Ferreira,
CEO do Grupo Connvert
“Os canais digitais foram uma opção para quem estava com uma plataforma omnichannel, pois conseguiram criar jornadas de qualidade no atendimento, e gerar boas experiências. Quem não estava preparado e se aventurou, gerou atendimentos fragmentados e confusos.”
Leonardo Sanchez,
presidente da Nice Brasil
“Os novos canais que foram abertos ou promovidos durante a pandemia continuam funcionando mesmo após a normalização dos atendimentos nos canais tradicionais. Atualmente, o consumidor tem acesso a serviços digitais em todas as áreas. Isso faz com que as empresas que não estiverem preparadas para o omnicanal corram o risco de serem deixadas de lado pelo consumidor.”
Digitalização: imprescindível e sem volta
Empresas que lidam diariamente com os consumidores também notaram o vaivém de consumidores nos canais. Segundo o Itaú Unibanco, houve um aumento em todos os canais, inclusive no telefone. “O uso de todos os nossos canais de atendimento aumentou, tanto no telefone quanto nos nossos canais digitais. Esse aumento foi decorrente da instabilidade financeira e do momento desafiador pelo qual nosso País e o mundo estavam vivenciando”, conta Andrea Carpes, diretora de Atendimento ao Cliente do Itaú Unibanco.
Mais do que contato, o Itaú percebeu um aumento das transações digitais. Renato Mansur, diretor de Canais Digitais do banco, relata que houve aumento de 42% no volume de conversas via assistente virtual no último ano. “Apenas no WhatsApp, foram 1,5 milhão de novos clientes utilizando o canal. As interações digitais no internet banking e mobile cresceram 27% em relação ao ano anterior, 42% no assistente virtual, e aumentamos em 18 vezes o número de mensagens recebidas no WhatsApp.”
A Sky, uma das maiores empresas de telecomunicações, também registrou um aumento no contato de clientes, mas não acredita em consumidores exclusivamente digitais após a pandemia. O processo será um pouco mais longo, afirma Luis Otavio Marchezetti, vice-presidente de Engenharia, Banda Larga e Experiência do Cliente da Sky.
“O atendimento humano segue como uma opção importante para tratar questões mais complexas. A digitalização é imprescindível e um caminho sem volta, mas meios físicos de atendimento não podem deixar de existir para uma empresa capilar como a SKY”, afirma, ressaltando que o período de distanciamento social possibilitou à empresa avaliar a variedade de serviços de atendimento às demandas individuais dos consumidores.
Já o Bradesco, que trabalha há mais de dez anos no conceito omnichannel e estuda a experiência do cliente, também adota um discurso mais conservador quanto à digitalização dos usuários. “Acreditamos que o trabalho de transformação digital é uma maratona, não um tiro de 100 metros. As bases que permitiram estarmos prontos para uma aceleração na adoção do digital, durante a pandemia, estavam construídas desde antes e, com elas, pudemos acelerar adaptações e evoluir ainda mais na fluidez das experiências”, afirma Marcelo Frontini, diretor dos Canais Digitais da corporação.
Frontini acredita que ainda vamos conviver por muito tempo com preferências de uso mais físicas e analógicas, ao mesmo tempo em que, lentamente, o Brasil comece a crescer no âmbito digital. “Isso não tem a ver com classe social ou perfil demográfico. Tem a ver com a escolha pela experiência que mais se adapta ao seu jeito de viver. Portanto, independentemente de onde e para quem, essa simbiose, que alguns teóricos chamam de phygital, é a combinação entre experiências físicas e digitais necessária para abraçar todas as pessoas, oferecer comodidade e fluidez, e manter-se sustentável como negócio.”
Andrea Carpes,
diretora de Atendimento
ao Cliente do Itaú Unibanco
“O uso de todos os nossos canais de atendimento aumentou, tanto no telefone quanto nos nossos canais digitais. Esse aumento foi decorrente da instabilidade financeira e do momento desafiador pelo qual nosso País e o mundo estavam vivenciando.”
Renato Mansur,
diretor de Canais Digitais
do Itaú Unibanco
“Apenas no WhatsApp foram
1,5 milhão de novos clientes utilizando o canal. As interações digitais no internet banking e mobile cresceram 27% em relação ao ano anterior, 42% no assistente virtual, e aumentamos em 18 vezes o número de mensagens recebidas no WhatsApp.”
Maturidade é pré-requisito para o digital
Outro fator que fundamenta a omnicanalidade phygital em massa é polêmico para as empresas e a constatação sobre o consumidor: na média, todos precisamos amadurecer quando o assunto é o mundo digital.
Um dos motivos é a desconfiança que existe no consumidor (e das empresas, que são formadas pelos mesmos clientes) diante de uma novidade, um comportamento que até Freud explica: em meio ao novo, o ser humano adota um comportamento conservador.
Nesse cenário, a omnicanalidade se torna ainda mais imprescindível. A partir dessa ideia, empresas aprendem a sincronizar os canais analógico e os digitais em uma única comunicação, facilitando assim a transição para uma compra ou contratação de serviço exclusivamente virtual. É o que os especialistas definem como maturidade digital. Será preciso oferecer atendimentos que possam ser integrados em múltiplos canais, como, por exemplo, no caso de atendimentos que começam por telefone e continuam via chat, posteriormente.
A opção da continuidade pode ser inviabilizada por motivos diversos, desde falta de mão de obra interna até utilização de sistemas legados, conforme aponta o presidente da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT), John Anthony von Christian.
“Nesses casos, a omnicanalidade funciona de forma muito superficial. Por isso, com certeza sairemos da pandemia mais multicanais, mas um pouco mais conservadores sobre o omni.”
Para que um atendimento omnichannel proporcione uma boa experiência e atenda, de fato, às solicitações do consumidor, von Christian sugere que sejam utilizados sistemas integrados através de API (Application Programming Interface), que são uma forma mais simples e estruturada de comunicação entre sistemas.
“Um relacionamento exclusivamente digital demanda muita maturidade digital das empresas. Esse cenário é encontrado em muitas das empresas mais recentes, as nativas digitais – Uber, Nubank e QuintoAndar são bons exemplos”, diz. Em relação às grandes corporações, essa transformação exige outros ingredientes: foco, investimento e profissionais que saibam conduzir esse processo. “Pela magnitude dessas companhias, esse movimento não é rápido, ou seja, para que tenhamos um relacionamento exclusivamente digital, falta tempo. O telefone ainda é o principal meio de contato para atendimento.”
Luis Otavio Marchezetti,
vice-presidente de Engenharia,
Banda Larga e Experiência
do Cliente da Sky
“O atendimento humano segue como uma opção importante para tratar questões mais complexas. A digitalização é imprescindível e um caminho sem volta, mas meios físicos de atendimento não podem deixar de existir para uma empresa capilar como a SKY. ”
Marcelo Frontini,
diretor dos Canais Digitais
do Bradesco
“Acreditamos que o trabalho de transformação digital é uma maratona, não um tiro de 100 metros. As bases que permitiram estarmos prontos para uma aceleração na adoção do digital, durante a pandemia, estavam construídas desde antes e, com elas, pudemos acelerar adaptações e evoluir ainda mais na fluidez das experiências.”
Próximos passos: investir na jornada fluida e linear
O atendimento digital também enfrentou outro obstáculo importante e que, novamente, justifica a aposta na omnicanalidade phygital. Muitas empresas adotaram modelos digitais de relacionamento às pressas, o que resultou em um desenho da jornada de experiência repleto de gargalos. E o que isso gerou? O consumidor até gostou do que viu no mundo digital, mas a comunicação mostrou gargalos importantes e que precisam ser revistos a partir de agora.
“O maior desafio para um relacionamento exclusivamente digital ainda está na integração dos canais com os legados de forma que escale os processos. A omnicanalidade é o melhor caminho para melhorar a experiência e não reverter o que a pandemia acelerou no comportamento do cliente”, observa. “O maior desafio de implantar omnicanais não está na tecnologia, mas na análise de perfil do cliente e no desenho de jornada, em que transformamos a experiência do nosso cliente”, afirma Ferreira, da Connvert.
Para Renato Mansur, diretor de Canais Digitais do Itaú Unibanco, o importante é que o relacionamento digital possa proporcionar liberdade e comodidade aos clientes por meio de autosserviço, uma vez que ainda há desafios a serem vencidos. “O desafio da omnicanalidade passa por manter o nível de qualidade de serviço nas diversas interações dos nossos clientes, independentemente do canal utilizado. Isso é importante, pois há um desafio de digitalização de alguns públicos que, mesmo durante o período de distanciamento social, ainda não aderiram ao uso do digital.”
Na AeC, o time de UX precisou criar experiências adaptadas para cada público específico. “Por exemplo, nós fizemos ajustes em robôs e URAs de clientes que possuem uma parcela significativa de clientes idosos, pois vimos um maior uso de canais digitais por este público. Assim, nós aumentamos o tempo de espera aguardando o cliente digitar um documento como o CPF, por exemplo”, conta Marco Machado, diretor de Transformação Digital e Sistemas da AeC.
A UX foi tão importante para a AeC que resultou em mudanças na fraseologia dos robôs, que se tornaram mais amigáveis a esses usuários, também pelo acréscimo das demandas em atendimentos digitais. Mais do que isso, a UX ajuda a entender até mesmo quais são os canais necessários para cada negócio.
“O canal relevante para você é o canal onde o seu cliente está. Se você não tem um site ou um portal com alta visitação e alto fluxo de clientes, não faz sentido ter um canal de chat nesse site, por exemplo, porque ele não é um lugar onde seu cliente já está acostumado a entrar. No entanto, para uma empresa com pouco tráfego de pessoas nas redes sociais, será que faz sentido investir nesse canal?”, questiona.
John Anthony von Christian,
presidente da Associação Brasileira
de Telesserviços (ABT)
“Nesses casos, a omnicanalidade funciona de forma muito superficial. Por isso, com certeza sairemos da pandemia mais multicanais, mas um pouco mais conservadores sobre o omni.”
Confiança: o elemento básico da experiência
Felizmente, com a quantidade de novidades digitais a que consumidores e empresas foram expostos, surgiram outras novidades que vão além da CX e da UX. Essa nova realidade nos mostrou que dados serão decisivos na construção de jornadas exclusivamente digitais. É preciso se debruçar sobre essas informações para que possamos ter uma comunicação uniforme em todos os canais – justamente a essência da omnicanalidade.
“O consumidor precisa saber que pode sempre contar com a empresa. Caso ele tenha uma experiência ruim, não vai pensar duas vezes em abandonar a marca”, destaca Mauricio Castro, diretor de Marketing e Transformação da Atento Brasil. Para que as marcas possam construir um elo de confiança com o consumidor, Castro sugere que se invista na construção de uma relação ao longo de todo o atendimento, gerando experiências positivas e, por consequência, fidelizando e transformando consumidores em defensores e divulgadores da empresa. “Já sabemos que não basta apenas resolver o problema; é preciso focar a experiência do consumidor. Resultados positivos passam, sem dúvidas, pelo processo de gerar confiança ao consumidor.”
Este investimento a relação marca-consumidor, segundo Castro, traz inúmeros benefícios como, por exemplo, o ganho de agilidade no retorno para o consumidor, a capacidade de fornecer uma experiência única e contínua, independentemente do número de interações e canais utilizados, e o acompanhamento de todos os canais de forma integrada, o que permite melhor controle da qualidade da experiência.
“Não basta convergir interações tradicionais em digitais; precisamos criar uma jornada fluida e linear para o consumidor, mesmo que ela passe por diversos canais. O diferencial da Atento é que a aplicação de canais integrados não está apenas baseada em tecnologia, mas leva em consideração também questões como usabilidade e experiência do consumidor, compreensão de cada perfil e contexto em que ele está inserido.” Assim, oferecer múltiplos canais de atendimento aos consumidores é um caminho sem volta para negócios de diversos segmentos
Empatia e confiança
Nessa aventura essencialmente digital, empresas também perceberam outra lição importante: é preciso levar a empatia do mundo analógico para o mundo digital.
Esta é a opinião de Marco Aurélio Borges Matos, diretor de Relacionamento com o Cliente da Algar Tech, empresa que passou de 800 mil interações nos canais digitais ao mês para mais de 1 milhão. “O cliente tornou-se mais exigente e passou a esperar das marcas um atendimento em canais de voz e digitais de forma tão eficiente quanto tinha presencialmente antes da pandemia, esperando que a jornada seja mantida.”
Segundo o diretor, o cliente também passou a esperar mais proximidade e empatia por parte das empresas com as quais se relaciona, em todos os seus pontos de contato. “Não podemos esquecer a empatia e a capacidade de se relacionar – características inerentes aos humanos. Por mais que tenhamos inteligência artificial e processos automatizados, muitas pessoas ainda sentem a necessidade de conversar com uma pessoa, que demonstrará compreensão e preocupação com o problema que ela está vivenciando”, constata. Desta forma, a Algar Tech aposta que o atendimento humano continuará forte e ativo mesmo com o crescimento da adoção dos canais digitais. “A tecnologia será utilizada a favor do ser humano, mas ele será sempre indispensável na busca por soluções mais complexas e para a construção de uma relação empática e de cuidado efetivo com o outro.”
Mauricio Castro,
diretor de Marketing e Transformação da Atento Brasil
“O consumidor precisa saber que pode sempre contar com a empresa. Caso ele tenha uma experiência ruim, não vai pensar duas vezes em abandonar a marca.”
Confiança: o elemento básico da experiência
Felizmente, com a quantidade de novidades digitais a que consumidores e empresas foram expostos, surgiram outras novidades que vão além da CX e da UX. Essa nova realidade nos mostrou que dados serão decisivos na construção de jornadas exclusivamente digitais. É preciso se debruçar sobre essas informações para que possamos ter uma comunicação uniforme em todos os canais – justamente a essência da omnicanalidade.
“O consumidor precisa saber que pode sempre contar com a empresa. Caso ele tenha uma experiência ruim, não vai pensar duas vezes em abandonar a marca”, destaca Mauricio Castro, diretor de Marketing e Transformação da Atento Brasil. Para que as marcas possam construir um elo de confiança com o consumidor, Castro sugere que se invista na construção de uma relação ao longo de todo o atendimento, gerando experiências positivas e, por consequência, fidelizando e transformando consumidores em defensores e divulgadores da empresa. “Já sabemos que não basta apenas resolver o problema; é preciso focar a experiência do consumidor. Resultados positivos passam, sem dúvidas, pelo processo de gerar confiança ao consumidor.”
Este investimento a relação marca-consumidor, segundo Castro, traz inúmeros benefícios como, por exemplo, o ganho de agilidade no retorno para o consumidor, a capacidade de fornecer uma experiência única e contínua, independentemente do número de interações e canais utilizados, e o acompanhamento de todos os canais de forma integrada, o que permite melhor controle da qualidade da experiência.
“Não basta convergir interações tradicionais em digitais; precisamos criar uma jornada fluida e linear para o consumidor, mesmo que ela passe por diversos canais. O diferencial da Atento é que a aplicação de canais integrados não está apenas baseada em tecnologia, mas leva em consideração também questões como usabilidade e experiência do consumidor, compreensão de cada perfil e contexto em que ele está inserido.” Assim, oferecer múltiplos canais de atendimento aos consumidores é um caminho sem volta para negócios de diversos segmentos.
Marco Aurélio Borges Matos,
diretor de Relacionamento com o Cliente da Algar Tech
“Não podemos esquecer a empatia e a capacidade de se relacionar. Por mais que tenhamos inteligência artificial e processos automatizados, há, ainda, a necessidade
de conversar com uma pessoa.”
Empatia e confiança
Nessa aventura essencialmente digital, empresas também perceberam outra lição importante: é preciso levar a empatia do mundo analógico para o mundo digital.
Esta é a opinião de Marco Aurélio Borges Matos, diretor de Relacionamento com o Cliente da Algar Tech, empresa que passou de 800 mil interações nos canais digitais ao mês para mais de 1 milhão. “O cliente tornou-se mais exigente e passou a esperar das marcas um atendimento em canais de voz e digitais de forma tão eficiente quanto tinha presencialmente antes da pandemia, esperando que a jornada seja mantida.”
Segundo o diretor, o cliente também passou a esperar mais proximidade e empatia por parte das empresas com as quais se relaciona, em todos os seus pontos de contato. “Não podemos esquecer a empatia e a capacidade de se relacionar – características inerentes aos humanos. Por mais que tenhamos inteligência artificial e processos automatizados, muitas pessoas ainda sentem a necessidade de conversar com uma pessoa, que demonstrará compreensão e preocupação com o problema que ela está vivenciando”, constata. Desta forma, a Algar Tech aposta que o atendimento humano continuará forte e ativo mesmo com o crescimento da adoção dos canais digitais. “A tecnologia será utilizada a favor do ser humano, mas ele será sempre indispensável na busca por soluções mais complexas e para a construção de uma relação empática e de cuidado efetivo com o outro.”
Confiança e comunicação integrada
Em outras palavras, empatia é o elemento subjetivo que estabelece confiança entre pessoas – mesmo que uma delas seja jurídica. De nada adianta o atendente do SAC telefônico ser simpático e atencioso se o chatbot simplesmente não se comunicar da mesma maneira. E aqui chegamos em um ponto crucial da construção de canais conjugados e que falam a mesma língua: confiança no mundo digital é o somatório de tecnologia, mapeamento correto da jornada, análise da experiência do consumidor e, claro, empatia.
“É fato que a comunicação integrada melhora muito a experiência de atendimento ao cliente, o qual, durante a quarentena, ficou cada vez mais multiconectado e exigente passou a contar, inclusive, com a possibilidade de atendimento por videochamada”, destaca Domenico Rossi, vice-presidente sênior de Operações da AlmavivA do Brasil. A empresa, após o início da pandemia, teve um acréscimo de 900 mil chamadas no escopo de voz. “Antes da pandemia, era solucionada, em média, 1,7 dúvida por ligação, mas o número passou para 2,9 durante o isolamento”, diz Rossi.
Diante desse cenário, para evitar algum tempo de espera em ligações, Rossi explica que houve um fenômeno de migração natural de parte dos clientes para os canais digitais das empresas, em busca de um atendimento mais pontual. “Essa elevação de interações com bots e ferramentas tecnológicas, que dispõem de inteligência artificial, colaborou muito para sua evolução, pois elas ficam mais eficientes a cada contato com o cliente, aprendendo a lidar com novas situações e se adaptando melhor à necessidade do consumidor”, pontua.
Entre os desafios de uma possível omnicanalidade em massa, Rossi cita a impossibilidade de todos terem a mesma infraestrutura à disposição, além dos sistemas legados. “Os desafios são o acesso à internet ou à rede de telefonia móvel de dados, bem como a aparelhos smartphones, tendo em vista que a maioria das tecnologias de atendimento digital é realizada por meio de aplicativos – poucas ainda atuam com SMS. Além disso, é preciso uma integração dos legados de infraestrutura de empresas mais antigas, pois em muitas ainda existem processos manuais”. Contudo, o VP é otimista em relação a um futuro mais conectado no relacionamento com o cliente. “Acreditamos que a tendência do atendimento omnichannel chegou para ficar, mesmo no período pós-pandemia. É uma experiência positiva que empresas e consumidores devem levar para o futuro.”
WhatsApp: o próximo telefone?
No fim, fica a dúvida: o que será do futuro do relacionamento com o cliente diante da inevitável digitalização do atendimento?
Neste momento, o WhatsApp se apresenta como forte candidato por vários motivos: é fácil de usar, permite integrar diversos serviços e tem potencial para outras novidades.
Um dos que apostam no WhatsApp é Sanchez, da nice Brasil. “Podemos esperar que em toda relação haja algum tipo de relacionamento digital. Há pouco tempo, ninguém imaginava que usaríamos canais como WhatsApp para se comunicar com nosso consumidor, e isso hoje é muito comum. Provavelmente outras ferramentas surgirão em breve e farão parte da nossa rotina. Sempre haverá algum elo da cadeia com o relacionamento pessoal.”
De fato, o elo é a palavra que resume o momento. Unir todos os canais em uma única voz parece ser o caminho correto para uma omnicanalidade exclusivamente digital. Por ora, é preciso fazer igual ao ditado: um olho no peixe e outro no gato.