REBECA DE MORAES
Diretora da Soledad
O Cultura-
ostentação
É O QUE JUNTA ANITTA E COACHELLA
O Cultura-
ostentação
É O QUE JUNTA ANITTA E COACHELLA
REBECA DE MORAES
Diretora da Soledad
REBECA DE MORAES
Diretora da Soledad
“Se antes a globalização era um processo protagonizado por empresas e governos, agora temos um movimento movido pela consciência dos consumidores que escolhem ostentar suas identidades transnacionais”
Dia desses, numa apresentação interna de uma pesquisa de tendências que estávamos fazendo para um cliente muito interessado em entender a leitura de movimentos globais dentro do contexto da América Latina, as pesquisadoras do meu time trouxeram um slide com algumas imagens que me surpreenderam. De um lado estavam garotas americanas no Coachella, um dos eventos de música mais ditadores de tendência do mundo, em Los Angeles. Elas tinham fitas isolantes pretas coladas no corpo, combinadas com seus shorts jeans propositalmente rasgados, cabelos levemente ondulados e coroas de flores na cabeça. Do outro lado, uma foto da cantora Anitta, esta que me dispensava apresentações, em cena do clipe “Vai Malandra”. A celebridade global usava biquíni desenhado com fita isolante, moda criada pela empreendedora Erika Bronze para vender a mulheres do País todo o bronzeado e a marquinha “ideal” em sua laje no Realengo.
As fotos, misturadas numa única página, pareciam ter vindo do mesmo lugar. Mas o Realengo não é o Coachella. E o efeito disso é mais do que a globalização como conhecemos. Claro, podemos tentar justificar isso como a informação que circula pelo mundo. Anitta é de fato uma celebridade com notável sucesso fora do Brasil, com cacife suficiente para influenciar as it girls americanas. Mas, em 2019 e nos próximos anos, precisamos reparar um tempero a mais nisso: se antes a globalização era um processo protagonizado por empresas e governos – estes transportavam de um lado para outro informações, culturas e referências –, agora temos um movimento movido pela consciência dos consumidores que escolhem ostentar suas identidades transnacionais. É a era do que chamamos de cultura-ostentação.
A cultura pop é o território no qual conseguimos observar essa tendência emergir. O consumo cultural vira uma expressão da liberdade, das nossas aspirações e também uma marca de distinções. Antes a nossa identidade costumava ser um produto de onde você nasceu, com idade, raça, gênero e nacionalidade firmemente fixados para determinar seu lugar no mundo. Agora, nossas identidades estão indo mais longe em direção a algo que coletamos, montamos e organizamos. Por isso é absolutamente possível ver uma personalidade como Anitta usando a mesma referência de moda das meninas do Coachella, e ter uma música cantada em três línguas: português, espanhol e inglês.
Antes, as identidades eram fixas e permanentes. Agora, nossas identidades se tornam um catálogo das experiências que escolhemos contar. E a globalização nos permite acessar a cultura do outro com o esforço de um clique e qualidade-padrão de Holywood. De Coachella ao Realengo, tudo junto e misturado, tudo Brasil e tudo global. Tudo latino. Quem não entender o mundo assim, vai perder parte importante dessa festa.
“Se antes a globalização era um processo protagonizado por empresas e governos, agora temos um movimento movido pela consciência dos consumidores que escolhem ostentar suas identidades transnacionais”