É HORA DE DAR PROPÓSITO AO PROPÓSITO
POR ROBERTO MEIR
“Valor compartilhado não é sobre responsabilidade social, filantropia ou sustentabilidade, mas sim sobre uma nova forma de companhias atingirem sucesso econômico”. A teoria, de Michael E. Porter, professor da Harvard Business School e um dos pensadores mais influentes em gestão e competitividade, mostra que enquanto empresas voltadas à filantropia e à responsabilidade social corporativa focam minimizar e retribuir os danos causados pelo seu negócio à sociedade, os líderes das companhias centrados em valor compartilhado vão ao que interessa: maximizam o seu valor competitivo, resolvendo problemas para consumidores e para o mercado, ou seja, não se trata de algo na periferia daquilo que a empresa faz, mas no centro.
E as empresas precisam entender de uma vez por todas que podem gerar valor econômico com a criação de valor social. É óbvio que a cadeia de valor de uma empresa acaba esbarrando em questões como o uso de recursos naturais, condições de trabalho e segurança. O segredo é transformar esses desafios em oportunidades. Lá atrás, em 2011, Porter destacou três formas de se fazer isso: reconcebendo produtos e mercados, redefinindo a produtividade na cadeia de valor e montando clusters setoriais de apoio nas localidades da empresa. Cada uma delas, segundo o especialista, são parte do círculo virtuoso do valor compartilhado, ou seja, melhorar o valor em uma área abre oportunidades nas outras.
“O ‘Seu Brandão’ viveu e morreu entendendo que o trabalho compensa, dignifica e transforma a sociedade em que vivemos”
É o que tem feito a Nespresso, por exemplo. Uma das divisões da Nestlé, ela reinventou a forma de se tomar café, investindo na multicanalidade, na reciclagem, na eficiência de entrega e aproximando o consumidor da marca. Ela também soube lidar com o desafio de garantir o fornecimento confiável de grãos especiais. E conseguiu fazer isso muito bem ao firmar uma parceria com a Rainforest Alliance por meio da qual capacita mais de 70 mil agricultores. Isso porque ela entende que fornecedores marginalizados não conseguem se manter produtivos. É um jogo de ganha-ganha. Ao melhorar a cadeira produtiva, concedendo financiamentos, treinamentos e até planos de aposentadoria para quem lhe presta serviço, a marca consegue garantir mais eficiência, grãos de qualidade e aumento do volume de produção. Isso é gerar valor compartilhado.
Talvez seja isso que falte aos Millennials, uma geração preocupada com questões ambientais, de gênero e de proteção animal, mas ingênua na hora de aplicar isso aos negócios. Nenhuma empresa vive de caridade. O próprio comandante Rolim Amaro, empresário que transformou a TAM na maior companhia aérea do Brasil entre os anos 1970 e 2001, já destacava que sem dinheiro não é possível ter propósito, tampouco entregar boas experiências ao cliente. Portanto, é hora de dar propósito ao propósito. E entender que o sucesso de uma companhia está intrinsicamente relacionado a um trabalho duro, ético e responsável. Foi o que fez a vida toda o saudoso Lázaro Brandão, que partiu aos 93 anos deixando um grande legado. Estamos falando aqui de um brasileiro antológico, que trabalhou até o último dia, se mostrando um exemplo de dignidade e ética. Sim, ele viveu e morreu entendendo que o trabalho compensa, dignifica e transforma a sociedade em que vivemos. Tenho orgulho de dizer aqui que, se todos nós seguíssemos os princípios e os valores do “Seu Brandão”, teríamos um Brasil bem diferente. A começar pelas novas gerações, cujo desprendimento e inconsequência acabam por destruir valor. Justo elas, que tanto defendem a economia compartilhada, deveriam enxergar que o maior compartilhamento é o de valor. É saber olhar para o outro, mas também para si mesmo e para tudo que nos cerca.