
O design que salva
QUE TIPO DE “NORMAL” VOCÊ PREFERE? O novo normal ou o agora normal? Dado o contexto de instabilidade e complexidade que a pandemia de COVID-19 nos forçou a enfrentar, podemos ser perdoados por buscar uma trégua ou um retorno mais duradouro a uma zona de conforto pessoal e coletiva. No entanto, fazemos isso por nossa própria conta e risco. A linguagem de qualquer “normal” está sendo implantada quase como uma forma de suprimir incertezas resultantes do novo coronavírus. Uma coisa é certa: o “novo” não funcionou para a maioria da população mundial. Então por que começaria a funcionar agora?
Podemos aprender muito com o mundo do design, em que não apenas o normal era mortal no passado, mas continua a matar no presente. Em maio deste ano, o jornal inglês The Guardian relatou que as vidas das mulheres trabalhadoras de saúde foram postas em risco porque o normal, para o qual o equipamento de proteção individual é projetado, é de um homem de 1,83 m de altura, semelhante a um jogador de rúgbi. Também as máscaras de proteção individual são projetadas para um modelo masculino, com a ironia de que 75% dos trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde Britânico são mulheres. Caroline Criado Perez, cujo livro Mulheres Invisíveis aborda a questão da exclusão no design, disse ter sido inundada com mensagens de profissionais de saúde que não conseguiram encontrar os equipamentos de proteção adequados.
Infelizmente, este caso não é novo. Os homens têm maior probabilidade do que as mulheres de se envolver em um acidente de carro, o que significa que a maior quantidade de pessoas gravemente feridas são homens. Mas, quando uma mulher se envolve em um acidente de carro, ela tem 47% mais probabilidade de se ferir gravemente e 71% mais probabilidade de sofrer lesões moderadas, mesmo quando os pesquisadores levam em consideração fatores como altura, peso, uso do cinto de segurança e gravidade do acidente. E tudo tem a ver com a forma como o carro foi projetado – e para quem. Como os carros são tradicionalmente construídos para o corpo dos homens, que adotam uma posição sentada “normal”, as mulheres são motoristas “fora de posição” e, como resultado, têm 17% mais chances de morrer.
Algumas marcas globais, incluindo IKEA, Walmart e Microsoft, estão liderando iniciativas de design mais inclusivas, seja criando ambientes de compras para crianças autistas, seja para controladores Xbox para jogadores com mobilidade física severamente limitada. Uma coisa é evidente: quando se trata de seres humanos, não existe “normal”. Em vez de buscar um retorno ao passado, devemos aproveitar ao máximo nosso desconforto do momento atual para questionar como nossas próprias suposições e preconceitos continuam a excluir. Ao fazer isso, talvez possamos gerar um “novo paradigma”, não um “novo normal”.