O ecossistema de comunicação
dentro do chatbot
A pandemia resultou em um salto evolutivo na adoção do chatbot nas relações de consumo. Agora, todo esse processo levanta o debate sobre o futuro do chatbot, que, tudo indica, será um complexo ecossistema de relacionamento entre empresas e consumidores
por Ivan Ventura
NOS ÚLTIMOS ANOS, VOCÊ LEU NO Anuário Brasileiro de Relacionamento com Clientes que os chatbots estavam ganhando a confiança do consumidor por diversos motivos, mas principalmente pela prontidão e rapidez nas respostas. Se fosse no início deste ano, provavelmente estaria lendo uma reportagem falando de novos avanços da tecnologia entre consumidores e empresas.
No entanto, a pandemia mudou o cenário e, agora, o prognóstico é outro. “Tivemos um crescimento de 40% no volume mensagens nos chatbots. Estou repensando até mesmo o meu provisionamento para armazenamento de mensagens para o próximo ano diante do volume”, afirma Solemar Andrade, CEO do Grupo Plusoft. “No fim do ano passado, eu tinha 300 milhões de mensagens trocadas por mês. Chegamos a 2 bilhões no fim do ano”, afirma Juliano Braz, sócio-diretor da Take Blip.
O momento é animador para empresas desse setor, mas também levantam questões importantes: o que aprendemos e para onde vamos quando o assunto é chatbot?

Solemar Andrade,
CEO do Grupo Plusoft
Crescimento
De acordo com a consultoria de tecnologia indiana MarketsandMarkets, o mercado de chatbot deverá crescer quase 30% ao ano até 2024. A euforia sobre essa tecnologia tem muito a ver com o desempenho do chatbot durante o distanciamento social e, ao mesmo tempo, com o impacto do vírus de origem chinesa na vida do contact center.
“O crescimento desta demanda já era uma realidade antes da pandemia, mas foi acelerado devido ao atual cenário. Ao mesmo tempo em que a busca por tecnologia aumentou, a necessidade de uma experiência cada vez melhor para os consumidores também fez crescer a demanda por outras disciplinas”, afirma Mauricio Castro da Silva, diretor de Marketing e Transformação da Atento no Brasil.

Maurício Castro da Silva,
diretor de Marketing e
Transfomação da Atento no Brasil
No início da pandemia, a orientação dos governos foi impedir a aglomeração de pessoas em locais públicos e um dos alvos foi o setor de contact center. Empresas até receberam autorizações do Poder Público para exercer a atividade, mas, no fim, preferiram não arriscar e optaram pelo home office. No entanto, isso não impediu a redução de trabalhadores.
Neste momento, entrou em cena o chatbot, a estrela em ascensão do atendimento ao cliente. “A pandemia trouxe um cenário inimaginável, em que muitos call centers ficaram fechados e o atendimento presencial, que muitas vezes era feito por lojas ou pontos de atendimento, também teve as suas portas trancadas. Nesta realidade, o canal de atendimento digital deixou de ser mais uma opção para ser a principal opção. Isso ocasionou um grande ‘corre-corre’ por parte das empresas para alavancar seus canais digitais”, disse Eduardo Endo, diretor de Tecnologia e Bots da Mutant.
Solemar define o movimento de empresas em busca de chatbot na pandemia de “projeto de três anos em seis meses”. E isso não é um exagero. Empresas que produzem essa tecnologia pediram que os projetos de chatbot em andamento fossem acelerados para algumas poucas semanas. Os novos clientes também tinham pressa, e pediram que a tecnologia fosse entregue o mais rápido possível.
Não à toa, o número de chatbots produzidos simplesmente explodiu no País. De acordo com um estudo divulgado em setembro deste ano, o Brasil rompeu a marca de 100 mil robôs criados. Há um ano, esse número sequer chegou a 60 mil no País. A pressa, no entanto, resultou em problemas na experiência do usuário e até em um esfriamento no volume de interações por chatbot.

“O próximo passo que iremos presenciar é a criação de um ecossistema de atendimento no qual o chatbot é apenas um elemento de uma relação do cliente com a marca.”
Eduardo Endo,
diretor de Tecnologia e Bots da Mutant
Informacional e transacional
Em outras palavras, em um primeiro momento, o chatbot rapidamente entrou na rotina dos consumidores e assumiu funções que dificilmente seriam adotadas sem a Covid-19. Uma delas é a oferta de uma jornada completa de compra no chatbot, o que inclui até meio de pagamento.
A Nissan, por exemplo, adotou um sistema automatizado de venda de carro por meio de um chatbot chamado Nissan Bot. Por meio dele, é possível comprar um carro sem sequer olhar para a cara do vendedor. Já a C&C – rede de material de construção, que incluiu uma jornada quase completa de consumo no chatbot – não inseriu ainda o pagamento no canal.
Os exemplos continuam se multiplicando e já levantam questões importantes. Uma delas é o debate sobre a ressignificação do papel do chatbot no relacionamento com o cliente: o que podemos esperar da tecnologia no futuro?
A Take, por exemplo, utiliza o nome “contato inteligente”, que, segundo a empresa, transcende a simples ideia de um canal. O contato inteligente seria um ativo digital e, dentro dele, poderiam existir outros chatbots com diferentes funcionalidades.
A Verint adotou uma nomenclatura própria para o chatbot. “Na Ticket (empresa global de benefícios), foram agregados produtos e serviços no chatbot que tornaram o canal de conversação mais robusto. Agora, o chatbot é uma solução de autoatendimento digital, que oferece um novo canal de interação para seus clientes”, afirma Diego Gomez, VP Sales, Latin American e Caribbean da Verint.
Integração e PIX
Tudo indica que essa complexidade (e os novos nomes) poderá ficar ainda maior em breve. O grande segredo por trás dessa evolução atende pelo nome de integração, ou seja, a possibilidade de incluir novos serviços no chatbot.
“Hoje, o bot está ‘falando’ com uma empresa de meio de pagamento, com um CRM e com um sistema de logística. Além disso, ele transporta mensagens e faz muitas outras ações. Há uma quantidade cada vez maior de integrações”, explica Solemar, do Grupo Plusoft.

O mercado de chatbot deverá crescer de US$ 2,6 bilhões em 2019 para US$ 9,4 bilhões em 2024, taxa composta de crescimento anual de 29,7%, segundo dados da consultoria indiana MarketsandMarkets. Os principais fatores de crescimento para o mercado incluem o avanço da tecnologia juntamente com a crescente demanda do cliente por autoatendimento e assistência ao cliente 24 horas por dia, 7 dias por semana, com custos operacionais mais baixos.
Hoje, de acordo com o estudo, os chatbots atuam como uma ferramenta eficaz para atrair, reter e envolver novos clientes, devido à sua capacidade de envolver clientes, coletar novos dados e encurtar os ciclos de vida de vendas. Portanto, o engajamento e a retenção do cliente são projetados para se tornarem uma área de aplicação crucial para implantar soluções de chatbot.
Esses pontos são refletidos em uma pesquisa realizada pelo Gartner, a qual mostra que, até 2022, 70% de todas as interações com clientes envolverão novas ferramentas, como chatbots, Machine Learning e mensagens pelo celular.

Juliano Braz,
sócio-diretor da Take Blip
Nesse processo, o Pix, recém-lançado meio de pagamento instantâneo, é apontado como peça fundamental para a massificação das transações no chatbot e para a evolução do chatbot. Executivos como Solemar acreditam que teremos um grande volume de transações por meio da tecnologia em 2021.
De fato, os primeiros números já impressionam. De acordo com dados do Banco Central, foram realizadas mais de 1 milhão de transações somente no dia 16 de novembro – data de início da disponibilidade da tecnologia para o consumidor.
“Acho que deveremos ter uma adoção maior de sistemas digitais a partir do Pix, principalmente pela facilidade da tecnologia. Quando eu olho para projetos que envolvem meios de pagamento, os quais podem ser feitos com modalidades distintas de aquisição, eu vejo que o Pix vai ter uma interligação muito forte com todas as jornadas digitais que a gente possa construir”, afirma Alexandre Azzoni, sócio-fundador e CSO da Callflex.
“O Pix será integrado, com certeza. Ele vem não só para as transferências efetivamente, mas para revolucionar a forma como a gente interage com a transação bancária. E o uso com o chatbot acaba sendo exponencial, e as possibilidades são meio infinitas”, explica Bruno Consul, CDO da Neobpo

No último dia 15 de novembro, o WhatsApp anunciou um novo recurso de pagamentos para usuários no Brasil. A partir da nova tecnologia, será possível enviar e receber dinheiro sem taxas e sem sair do aplicativo, com a proteção da plataforma Facebook Pay. Inicialmente, a novidade estará disponível para clientes do Banco do Brasil, Nubank e Sicredi com cartão de crédito ou débito; as transações serão processadas pela Cielo.
Em comunicado, o Whats–App explica que o recurso de pagamentos será liberado de forma gradual a partir desta data, e estará disponível futuramente para todos os usuários do Brasil, ou seja, talvez você tenha que esperar um pouco para experimentar.
Nesta fase inicial, será necessário ter um cartão de débito ou crédito das bandeiras Visa e Mastercard emitidos pelo Banco do Brasil, Nubank e Sicredi. No entanto, o Whats–App permitirá que mais instituições financeiras participem do recurso de pagamentos no futuro.

Bruno Consul,
CDO da Neobpo
Futuro
Na avalição destes executivos, o Pix e outras soluções que serão integradas ao chatbot devem criar um complexo e inovador modelo de relacionamento no mercado brasileiro. Há quem diga que será transformado em um ecossistema personalizado para cada cliente e que não ficará restrito a um chat. Na verdade, ele será uma interface capaz de ler texto, voz e até mesmo imagem em qualquer lugar. Nesse caso, a omnicanalidade estaria presente dentro de um universo chamado chatbot – e não mais o inverso.
“O próximo passo que iremos presenciar é a criação de um ecossistema de atendimento no qual o chatbot é apenas um elemento de uma relação do cliente com a marca. Entendo que, com o avanço da tecnologia, as empresas podem ser cada vez mais proativas, tornando-se um grande assistente pessoal digital do cliente e, de maneira digital, estar presentes em diversos momentos e por diversos canais, seja por WhatsApp, seja por Voice Assistant, Apps ou, até mesmo, por meio de uma URA Ativa, ou seja, o verdadeiro conceito de Customer Centricity, em que a empresa é um grande facilitador da vida do cliente”, explica Endo, da Mutant.
Ainda é cedo para afirmar o que vai acontecer com o chatbot no futuro. O novo normal da tecnologia a partir da pandemia ainda depende de como empresas vão lidar com temas como humanização da tecnologia, questões de gênero (pessoas querem chatbots gays ou não binários) e raça (há a necessidade de avatares negros) e até desafios mais técnicos, como o aumento exponencial do armazenamento de dados pessoais nos próximos anos. O curioso é que alguns destes temas é de natureza humana, ou seja, os robôs parecem estar no caminho certo.

» Será multitarefa
» Será um ecossistema e não apenas um canal
» Vai entender linguagem de texto e voz
» Terá um número crescente de integrações
» Vai incluir o meio de pagamento instantâneo Pix