PANDEMIA ALTERA TENDÊNCIAS NAS COBRANÇAS:
Seminário de Cobrança Digital, iniciativa pioneira do Grupo Padrão, discutiu os aprendizados da cobrança e inadimplência durante a pandemia; digitalização e personalização do atendimento são estratégias cada vez mais consolidadas
Por Carlos Eduardo Vasconcellos
O mundo, como sabemos, vem passando por uma vasta transformação digital. A nova dinâmica, que já caminhava a passos largos, teve o processo catalisado pelas demandas trazidas, às pressas, pela pandemia, a todos os setores – incluindo o de cobrança de dívidas.
Nesse sentido, as empresas de recuperação de crédito têm-se reinventado para efetivar cada vez mais as negociações com o cliente inadimplente. Desde a construção de uma base de dados até o uso da inteligência artificial, a tecnologia vai se consolidando como uma das principais estratégias dos credores. Mas a mudança não é apenas digital. As consequências da crise sanitária trouxeram a necessidade de compreender a situação do devedor e gerar um relacionamento mais humanizado. Esse somatório de novas práticas contribuiu para que o aumento da inadimplência fosse abrandado.
Essas e outras adaptações inevitáveis no mercado de crédito foram discutidas na última edição do Seminário de Cobrança Digital.

vice-presidente de Operações e Transformação Digital da AeC
Cobrança e inadimplência em tempos de pandemia
Hoje, mesmo com a retomada parcial das atividades que estavam paradas devido à pandemia, a economia vem se normalizando aos poucos, fazendo com que as instituições se organizem e estruturem a melhor forma para lidar com o devedor.
Para Jacques Meir, diretor-executivo de Conhecimento do Grupo Padrão, todo o sistema vem sendo afetado e o aumento da inadimplência é uma das consequências desse desarranjo.
“O aumento do desemprego foi bastante significativo, e os programas de redução salarial evitam um desemprego maior, mas trazem a perda de renda para diversas pessoas. Muitos profissionais que desempenhavam atividades autônomas também foram afetados. Tudo isso criou um conjunto de fatores que contribuem significativamente para um eventual aumento da inadimplência.”
Jansen Alencar,
CEO do Grupo Services
Momento de compreender e fidelizar clientes
Uma das formas encontradas para melhorar a experiência entre o consumidor e a instituição é a individualização de abordagens e atendimentos. Segundo Celso Mateus, vice-presidente de Operações e Transformação Digital da AeC, o primeiro passo é entender a experiência do cliente e conhecer o seu comportamento.
“É necessário também fazer uma análise por qual canal a pessoa está mais propensa a passar por um atendimento ou realizar um pagamento. Mais de 70% das cobranças realizadas pela AeC acontecem em canais digitais, por isso trouxemos empresas de tecnologia para dentro da empresa para fazer uma fábrica interna de softwares”, explica o executivo da AeC.
Fernando Rigotti, gerente de Cobrança e Operações do Banco RCI Brasil – companhia que suporta as operações das montadoras Renault-Nissan no País –, conta que, no começo da pandemia, foi possível identificar uma dificuldade maior com cobranças e créditos nessa indústria.
“Foi preciso precificar o cliente de modo diferenciado, com base no risco”, aponta.
Ele comenta que ocorreram muitas prorrogações das parcelas dos financiamentos de automóveis; desta forma, o trabalho do RCI foi muito focado na conversa com o cliente para se conseguir as melhores adequações dessas parcelas.
“Vimos o impacto dessas prorrogações em grandes bancos, justamente porque é difícil projetar o que irá acontecer com essa carteira no futuro”, complementa Rigotti, afirmando que corresponder às expectativas dos clientes é tão importante quanto a digitalização dos serviços.
A opinião é compartilhada por Marcelo Scarpa, diretor de Crédito Cobrança do digio. “As estratégias de cobrança sempre são definidas por grupos, mas a pandemia trouxe uma necessidade de ouvir o cliente de uma forma muito individual. A gente teve de entender que esse cliente, o qual está passando por uma dificuldade, faz parte do ciclo de vida dentro de uma instituição. As pessoas que perderam a capacidade de pagamento hoje vão voltar a ser clientes na retomada”, explica Scarpa.
Já Alexandre Riccio de Oliveira, diretor vice-presidente de Tecnologia, Operações e Financeiro do Banco Inter, e Camila Troquetti, head de Cobrança do Banco Carrefour, pontuam que investir em um bom relacionamento com o cliente pode facilitar a estratégia de retenção.
“É preciso pensar na sustentabilidade do relacionamento com o cliente. Valor para nós é ter o cliente dentro da plataforma em longo prazo”, diz o executivo do Banco Inter.
Camila Troqueti, por sua vez, destaca que o Banco Carrefour tenta manter o cliente ativo no portfólio da empresa e com uma reversão do cenário de atraso do pagamento em até 60 dias. “Para isso, a instituição possibilita a criação de soluções, através de carências maiores, taxas mais baixas e uma extensão no prazo para o pagamento de dívidas”, afirma.
Fabio Toledo,
head de CXM da Mutant
Para seguir a tendência de personalizar o atendimento, Marcelo Augusto Souza, head de Cobrança do Banco BV, conta que passou a ser necessário aumentar a base de dados para entender em qual momento o cliente estava. “Não tem como trabalhar cobranças se não for através do uso de estatísticas, de modelagem. É preciso customizar as ofertas conforme a necessidade do cliente e aferir essas necessidades a partir de modelos de informação de dados e com uma maior amplitude de canais.
Bruno Pazzoto, superintendente-executivo de Crédito e Modelagem da Midway, diz que, ao mergulhar nas ciências de dados, na comunicação com o consumidor e não subestimar a crise, a Midway, braço financeiro da Riachuelo, permitiu que muitos clientes saíssem ou evitassem a entrada na inadimplência.
“Como o varejo físico foi um dos segmentos impactados negativamente pelo isolamento social, o público-alvo não estava necessariamente preparado para os meios de pagamento digitais. Logo, foi necessária uma força-tarefa grande, por parte da Midway, para comunicar aos clientes que eles tinham novas possibilidades de pagamento dos créditos além das lojas”, explica.
Já o Grupo Recovery apostou em novos canais de cobrança. “Finalizamos 2019 com 35% de share de caixa vindo de canais digitais. Tínhamos o plano de chegar a 45% em dezembro de 2020, mas atingimos esse número em maio”, conta Solange Oliveira, diretora de Cobrança do Recovery.
De acordo com Felipe Lemos, diretor da startup de empréstimos Bom Pra Crédito, é importante ter sistemas flexíveis e parametrizados, pois possibilitam mais rapidez e precisão.
“O WhatsApp é uma das formas de contato mais recentes que foram colocadas à disposição do tomador, além da adoção de uma série de outras alternativas para se iniciar uma conversa sobre pagamentos”, compartilha.
Já Fabio Toledo, head de CXM da Mutant, reforça o papel do uso de estatísticas e inteligência artificial.
“A inteligência artificial vem para trazer um diferencial. Vamos acabar com as famosas réguas de cobrança que envolvem uma sequência de acões por SMS, e‑mail e telefone para realmente desenhar a jornada de cobrança.”
A Stone também reforçou o investimento na digitalização dos serviços. “Começamos um processo de digitalização do varejista físico e criamos um portal chamado ‘Compre Local e Cuide do Pequeno Negócio’, tendo como foco ajudar o negócio do bairro. E vimos que existiam diversas formas para se digitalizar, desde integrar os marketplaces ou mesmo criar formas de vender, através das redes sociais”, diz Bernardo Carneiro, sócio-diretor da empresa.
Mesmo antes de a COVID-19 chegar ao Brasil, o Grupo Services investiu em torno de R$ 10 milhões para aumentar o parque tecnológico, apostando que o contratante poderia precisar e a empresa deveria ser capaz, até mesmo, de dobrar a prestação de serviços caso fosse necessário.
“Uma das iniciativas que tomamos foi dobrar nosso parque de infraestrutura para fazer essa virada de chave para alguns clientes, diz o CEO, Jansen Alencar. “Quando falamos em digital, lembro que temos mais de uma centena de pessoas que produzem os robôs e as plataformas”, complementa.
