PERSONALIDADE
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QUE TAL PENSAR AO CONTRÁRIO?
“Tudo é duplo, tudo tem o seu oposto”, diz a quarta Lei Hermética (parte da filosofia egípcia). Aparentemente distante de nós, essa ideia tornou-se mais próxima do mundo corporativo graças a Patricia Cotton, CEO e fundadora da consultoria Upside Down Thinking. Ela cunhou o termo ao ver a própria cabeça revirar depois de vivências internacionais e de um mestrado em Liderança Criativa pela Berlin School of Creative Leadership, na Alemanha. Nesta conversa, Patricia detalha o que o conceito significa na prática.
POR RAISA COVRE
CONSUMIDOR MODERNO: COMO SURGIU O TERMO UPSIDE DOWN THINKING?
Patricia Cotton – O Upside Down Thinking é um movimento que empurra para o desconhecido, ajuda a desapegar da verdade por meio do pensamento ao contrário. Minha primeira surpresa quando fui para a Berlin School foi perceber que a inovação é absolutamente diferente em cada país. Ela depende de experiência, de visão de mundo. Percebi que não existe só um caminho para fazer essa travessia e que os opostos são a mesma verdade.
CM – O QUE ESSE CONCEITO SIGNIFICA NA PRÁTICA?
PC – Uma vez fiz um workshop para CEOs no Rio de Janeiro em que todos se achavam super-heróis imprescindíveis ao negócio e tinham prazer em dizer que não tinham tempo. Os motivos aparentemente plausíveis são vários: “se eu não trabalhar muito, não vai florescer”, “minha equipe é imatura”. Quando identifico qual é a crença que impede a inovação nesse contexto, formulo a sentença ao contrário. E aí chego à reformulação daquela verdade. Posso dizer que não tenho tempo, mas depois desse processo percebo que o tempo é uma escolha democrática e que, se eu quiser, terei tempo sim.
CM – COMO É O LÍDER “SUPER-HERÓI”?
PC – Liderança, assim como inovação, tornou-se um tema batido. Geralmente, a teoria coloca o líder como aquele que vai salvar todo mundo, que tem todas as respostas e dá a palavra final. Eu mesma, quando comecei o curso em Berlim, era muito controladora, com um ego sem precedentes. Era aquela que dizia “qualquer coisa, me liga”, como se o mundo fosse parar sem a minha presença. Com o tempo, percebi que era insustentável. Minha equipe ficou infantilizada e eu tinha síndrome de ansiedade generalizada. Na verdade, o líder é aquele que precisa se conhecer o bastante para ser capaz de dar espaço para a equipe crescer, correr riscos e tomar as próprias decisões.
CM – PODE NOS DAR ALGUM OUTRO EXEMPLO?
PC – Sim. Há alguns anos, uma agência inglesa tinha apenas 500 libras para fazer uma campanha. O que ela fez? Colocou um homem nas ruas segurando uma placa que dizia: “Danem-se os pobres”. Ele, claro, recebeu uma enxurrada de críticas. No dia seguinte, fez o mesmo, mas com uma placa que dizia: “Ajudem os pobres”. Sabe o que aconteceu? Ninguém o notou.
CM – EM UM MOMENTO DE VERDADES CORPORATIVAS TÃO CRISTALIZADAS, QUAL É A IMPORTÂNCIA DA PREMISSA DE PENSAR AO CONTRÁRIO?
PC – Todas as empresas dizem que são inovadoras, mas quando pergunto “quanto tempo você investe para inovar por semana?” ou “quanto tempo tem para executar novas ideias?”, sempre vejo uma distância muito grande entre fala e ação. Existe um abuso da palavra inovação. Tenho a sensação de que as empresas ficam numa embalagem, enchem a sala de post-its como se isso fosse um percurso quando é só um ponto de partida. Mudar exige esforço, mas pressupõe metas claras. Inovar é transformar e para isso eu preciso me abrir para a imprevisibilidade e silenciar a voz do medo.