REBECA DE MORAES
Diretora da Soledad
SOBREVIVEREMOS
AO MAL-ESTAR
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“Não faltam cursos, workshops, aulas rápidas e classes on-line para quem busca viver melhor diante da angústia dos nossos tempos”
Passar a régua em projetos. Ir a todas as confraternizações. Fazer todas as reuniões que ficaram pendentes. Ver a apresentação de fim de ano do filho. As apresentações, na verdade: a da escola, a do balé, a da natação. Comprar os presentes, claro! Isso não pode faltar. Encontrar vaga para estacionar no shopping. Nem precisava ter a edição de dezembro da Consumidor Moderno em mãos para saber que estou falando sobre obrigações de fim de ano.
Desafio você a me mostrar alguém que nestes últimos dias de 2019 não está #exausto. E pior: alguém que não diga que está exausto desde antes de os panetones chegarem às prateleiras do supermercado, em outubro. O tempo parece estar passando mais rápido, sentimos que temos menos tempo e, sim, estamos nos sentindo pior. Você não está sozinho. Uma pesquisa recente feita aqui na Trop mostra que 60% dos brasileiros se consideram um pouco ou totalmente insatisfeitos com sua situação de vida social. Com o desagrado sobre a própria situação, vem aquela conhecida sensação de que se poderia fazer mais (mas algo impede): 78% possuem algum projeto que não conseguem tirar do papel.
Gostaria de começar minha última coluna com uma mensagem de otimismo, mas a verdade é que não acredito muito nessa alegria que só sai na foto. Por outro lado, acredito que encarar as dores da realidade pode nos ajudar a criar futuros melhores para nós, nossos trabalhos e empresas. Precisamos pensar sobre o universo de frustração que estamos criando para nós mesmos. O que explica os números pouco otimistas do parágrafo anterior?
A sociedade capitalista sempre legitimou a narrativa do “vence quem for capaz”, em que nós mesmos assumimos a culpa e a glória por nossos erros e conquistas. Porém, o jeito de ser protagonista da própria história mudou. No passado, a felicidade cabia em uma checklist na qual preenchíamos nossa trajetória com sacrifício e sofrimento. Abrir mão de tempo com a família, do conforto, de férias no exterior ou do carro do ano podia ser considerado o preço a se pagar por uma recompensa maior no final. Porém, na sociedade da informação 24/7, estamos tão preocupados com a jornada que estamos nos esquecendo da linha de chegada.
O acesso rápido à informação e a sede por conhecimento nos colocam em contato com uma vida narrada por mídias sociais, em que a ideia de felicidade se associa ao bem-estar. Validamos nossas conquistas em pequenos momentos, nos quais há padrão de mensuração pra tudo. Tem o jeito certo de mostrar que se está curtindo um dia de sol, que o trabalho pesado está sendo feito, e também a metrificação é fácil: quantos likes? Operamos on-line um constante branding de nós mesmos, numa espécie de tirania da positividade, na qual impera uma sensação de que todo mundo está bem o tempo inteiro. Muito do que deveria nos fazer sentir completos está, na verdade, nos colocando mais pressão. Ih, está num dia difícil? Mas olha ali o vizinho fazendo um almoço maravilhoso com clientes sorridentes. Ainda não conseguiu começar a dieta? Basta abrir o Instagram para ver que, com certeza, alguém entre os seus contatos já postou aquela foto #tápago no espelho da academia. Usamos todo esse material de dieta, beleza e bem-estar para comparar e competir entre nós mesmos.
E, diante do nosso mal-estar, surge a economia do mal-estar: coaches de tudo, especialistas em aumento de produtividade, personal tudo. Não faltam cursos, workshops, aulas rápidas e classes on-line para quem busca viver melhor diante da angústia dos nossos tempos. É com esse pacote que vamos para 2020. Precisamos na vida pessoal manejar os desconfortos. Nas empresas, o desafio para os departamentos de recursos humanos e para os gestores é grande. Precisamos entender as realizações que nossos funcionários buscam, suas dificuldades e aliar o crescimento profissional ao pessoal no dia a dia – não só na linha de chegada. Que em 2020 a gente não espere pelo burnout para procurar ajuda para uma mente que não consegue acompanhar as evoluções tecnológicas – e ainda bem que não consegue. Se assim fosse, deixaríamos para trás o que nos faz humanos. E que em 2020 a gente possa dar risada do que hoje nos angustia. Até o futuro!
“Não faltam cursos, workshops, aulas rápidas e classes on-line para quem busca viver melhor diante da angústia dos nossos tempos”