VEM AÍ
A PRÓXIMA
ERA DOS BOTS
EM SUA SEGUNDA GERAÇÃO, OS ROBÔS DE ATENDIMENTO DEIXAM DE SER MERAMENTE INFORMACIONAIS, GANHAM VOZ E CAPACIDADE DE REALIZAR OPERAÇÕES MAIS COMPLEXAS. VEJA COMO AS EMPRESAS ESTÃO SE PREPARANDO PARA ESSA NOVA FASE
POR LEONARDO GUIMARÃES E RAPHAEL CORACCINI
É comum notarmos, pelas ruas, pessoas com a cabeça baixa, olhando fixamente para o celular. E, se as chances de elas estarem resolvendo algum problema pela internet são grandes, as de se distraírem, interagindo em uma rede social, são ainda maiores. Não à toa, as marcas vêm se dedicando a criar chatbots, seja para alavancar as vendas, seja para ajudar a resolver problemas de consumidores. O estudo Predictions 2019 da consultoria americana Forrester indica que, em três anos, a humanidade estará conversando mais com robôs do que com pessoas nas relações de consumo. As previsões da consultoria apontam, ainda, que este será o ano do estreitamento das interações entre robôs e seres humanos.
O mesmo estudo aponta que as áreas de vendas e marketing devem liderar a implementação de bots com inteligência artificial. Em seguida, estão suporte ao cliente, gerenciamento de produto, CEO ou conselho, risco, compliance e segurança. “O uso mais comum do bot é para o atendimento ao cliente. É o que a gente chama de primeiro nível, para dúvidas corriqueiras. Essa base de conhecimento é mais fácil de automatizar. Mas os bots também são comuns hoje para geração e qualificação de lead”, diz Felipe Volpato, CEO da Globalbot, empresa especializada em desenvolvimento de chatbots.
Dados da consultoria Deloitte mostram também que os chatbots estão abandonando a sua “primeira infância” e melhorando a capacidade de se relacionar com os seres humanos. A tendência é que eles deixem de ser apenas informacionais para se tornarem cada vez mais transacionais e, até mesmo, consultivos.
Sócio-líder da Indústria de Serviços Financeiros da Deloitte, Sergio Biagini discorda que os consumidores tenham preferência pelo atendimento humano. “Eles estão mais preocupados em serem bem atendidos do que se quem está do outro lado é um bot ou não”, avalia. Um estudo recente do instituto de pesquisa Grand View mostra, de fato, que 45% dos usuários de serviços ao redor do mundo já preferem ser atendidos por um chatbot.
OS TIPOS DE CHATBOTS
INFORMACIONAIS
Mais simples e diretos, são capazes de dar respostas simples para perguntas comuns
TRANSACIONAIS
Um pouco mais sofisticados e, geralmente, integrados a APIs internas e externas, permitem a confirmação de transações via mensagem, como pagamentos ou reservas de hotéis, por exemplo
PERSONALIZADOS/CONSULTIVOS
Mais inteligentes, evoluem conforme o número de interações. Isso permite que sejam capazes de prever demandas do consumidor antes mesmo que elas sejam percebidas e conseguem dar respostas mais fluidas e assertivas
OS TIPOS DE CHATBOTS
INFORMACIONAIS
Mais simples e diretos, são capazes de dar respostas simples para perguntas comuns
TRANSACIONAIS
Um pouco mais sofisticados e, geralmente, integrados a APIs internas e externas, permitem a confirmação de transações via mensagem, como pagamentos ou reservas de hotéis, por exemplo
PERSONALIZADOS/
CONSULTIVOS
Mais inteligentes, evoluem conforme o número de interações. Isso permite que sejam capazes de prever demandas do consumidor antes mesmo que elas sejam percebidas e conseguem dar respostas mais fluidas e assertivas
MATURIDADE É TUDO
Diante de um mercado que deve alcançar US$ 1,2 bilhão até 2025, as empresas se esforçam agora para tornar os bots mais maduros. Mas, para oferecer um bom atendimento digital, é preciso ter maturidade. Por aqui, os robôs ainda estão na fase informacional, ou seja, cumprindo, basicamente, o papel de resolver problemas primários. Quem mais desponta nesse sentido é o setor financeiro – número um no investimento em tecnologia, ao lado do governo. É o que mostra o levantamento “Digital Banking Consumer Survey”, também da Deloitte. Divulgado no ano passado, ele aponta que a quantidade de brasileiros que usam serviços on-line e mobile se equipara à de usuários de agências e caixas eletrônicos, com uma vantagem para os serviços virtuais: a frequência de uso. “Ao longo do tempo, os bots vão evoluir até chegar à transação e, depois, ao aconselhamento. A gente está na ponta dessa jornada e bastante coisa pode avançar”, prevê Sergio Biagini, sócio-líder da Indústria de Serviços Financeiros da Deloitte.
O Banco do Brasil vem recorrendo às plataformas de mensagem e redes sociais (WhatsApp, Facebook Messenger e Twitter) para ultrapassar a fase transacional dos bots. O banco estatal tem 122 mil usuários no seu WhatsApp e presta cerca de 800 atendimentos via chatbot nesse canal todo mês. O número de consumidores atendidos ainda é pequeno se comparado à base total de clientes do banco, de 63 milhões de pessoas, mas aponta uma adesão crescente e significativa. O uso de linguagem natural (que imita a linguagem humana) nos bots aumentou em 66% o acesso às plataformas on-line. Houve ainda redução de 69% do tempo médio para primeiras respostas e de 43% no tempo médio de atendimento de alta complexidade. O banco registrou ainda um ganho operacional de até 90% em redução de custos. Entre os serviços transacionais feitos pelo chatbot estão transferências entre contas, pagamentos e recebimentos, saques sem cartão, recarga do cartão de vale-transporte do metrô de São Paulo, recarga de celular e liberação de cartão. “Devido à utilização de linguagem natural na interação com os clientes e a possibilidade de acesso à informação a qualquer momento, os chatbots têm contribuído para o engajamento do público em geral, mostrando o quão mais cômodo pode ser”, afirma Auro Magnan, gerente-executivo do Programa de Transformação Tecnológica do Banco do Brasil.
“OS BOTS DEVEM SE TORNAR ADVISORS NUM FUTURO PRÓXIMO, INTEGRANDO INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL A CONTEXTOS E ANÁLISES DO COMPORTAMENTO DO CLIENTE”
AURO MAGNAN, GERENTE-EXECUTIVO DO PROGRAMA DE TRANSFORMAÇÃO TECNOLÓGICA DO BANCO DO BRASIL
Além das funções transacionais, o bot do banco no WhatsApp também realiza as etapas mais elementares do atendimento (informacionais): saldo e extrato de contas-correntes, poupanças e CDB, além de fatura e rastreio do cartão. A ambição, agora, é transformar robôs em aconselhadores. O Agrobot – uma espécie de consultor para o produtor rural – é a primeira. tentativa. “Os bots devem se tornar advisors num futuro próximo, integrando inteligência artificial a contextos e análises do comportamento do cliente”, ressalta Magnan.
Roberto Oliveira, CEO da Take, empresa de tecnologia especializada no desenvolvimento de bots, alerta, porém, que, na maioria dos contact centers, cerca de 80% das ligações dizem respeito a dúvidas corriqueiras. Por isso, diz o executivo, é fundamental que os bots informacionais sejam mais efetivos antes de serem lançados às etapas seguintes do desenvolvimento. “Na maioria dos bancos, o principal motivo das ligações é para pedir segunda via de boleto. Se a empresa já tem o API para fazer a busca, é muito melhor automatizar o processo”, analisa.
A Take afirma que conseguiu aumentar a automatização de atendimentos dos seus clientes de 5% para 30% em um ano e meio. “A gente planeja chegar a 80%, mas depende muito de como os usuários estão encarando o trajeto”, diz Oliveira. “O mais correto é educar o consumidor em vez de automatizar tudo no início. Ele precisa entender primeiro que existe um ganho no atendimento e que ele pode migrar da ligação para o atendimento por chatbot”.
Considerado o segundo maior banco do País, o Bradesco tem-se dedicado a otimizar seu atendimento básico. “A quantidade de usuários tende a ser sempre muito maior do que a capacidade de atendimento humano nas grandes empresas”, ressalta Henrique Albuquerque, head de Pesquisa e Inovação do banco. “As soluções de inteligência artificial conversacionais têm, potencialmente, capacidade de realizar grande parte de atividades de atendimento a clientes e de oferta de produtos e serviços realizadas hoje por pessoas, mas em escala e velocidade muito maiores”.


Foi com essa proposta que nasceu a BIA (Bradesco Inteligência Artificial), o motor de inteligência artificial do Bradesco, utilizada principalmente para o esclarecimento de dúvidas primárias. Diferentemente do Banco do Brasil, que tem limitado o número de pessoas atendidas via bots para oferecer um serviço mais transacional, o Bradesco aposta na ampliação exponencial do número de clientes atendidos pelo chatbot, ainda que para questões mais simples. Segundo o Bradesco, a BIA já realizou mais de 72 milhões de atendimentos e começa a se preparar para atribuições mais complexas. “Novas habilidades transacionais estão em fase de desenvolvimento inicial, algumas já disponíveis para clientes. Já é possível, por exemplo, consultar saldo e últimos lançamentos de conta pela BIA no WhatsApp do Bradesco”, conta Albuquerque. O executivo alerta ainda que, se a BIA fosse substituída hoje por uma central de atendentes humanos, seria necessário dobrar o quadro de funcionários do contact center.
A eficiência dos bots no setor bancário tem afastado as restrições que os consumidores têm de trocar o atendimento humano pelo automatizado. Quem garante isso é David Dias, diretor da Accenture Technology. “A gente tem observado um índice de satisfação de 80% com os chatbots desenvolvidos pela Accenture. Aquele paradigma de que as pessoas gostam de falar com outras pessoas cai por terra”, acrescenta.
A BIA, DO BRADESCO, JÁ REALIZOU MAIS DE 72 MILHÕES DE ATENDIMENTOS. ELA COMEÇA, AGORA, A SE PREPARAR PARA ATRIBUIÇÕES MAIS COMPLEXAS
O executivo também enxerga 2019 como o ponto de inflexão para o uso de bots no atendimento e crê que boa parte das interações via chatbots acontecerá dentro das redes sociais – em especial, via WhatsApp. “Boa parte das grandes marcas deve ter uma presença no WhatsApp por meio de um bot. Elas só estão esperando uma liberação mais ampla do próprio app, mas a tendência é de que nos próximos três meses seja aberta ainda mais sua plataforma para outras empresas”, prevê Dias.
E qual seria, então, o efeito colateral da explosão de bots dentro de plataformas de mensagens? “Nos próximos dois anos, os chatbots vão substituir os apps. Vamos ter interfaces de conversação que farão transações bancárias ou pagarão contas”, destaca o executivo. Dias afirma, ainda, que essa fase transacional dos bots nas redes sociais é resultado natural do amadurecimento das tecnologias e do fortalecimento dos sistemas de segurança dentro dessas plataformas.
Laboratório de desenvolvimento de bots da Mutant
O MAPA DOS BOTS
A Consumidor Moderno conversou com algumas empresas de diferentes setores da economia para saber qual é o estágio de desenvolvimento e a forma como utilizam os bots
SISTEMA FINANCEIRO
BANCO DO BRASIL
Tipos de bot: Informacional e transacional
Eficiência: Redução de 69% do tempo médio para as primeiras respostas, redução de 43% do tempo médio de atendimento de alta complexidade e resolução de 70% dos atendimentos em First Call Resolution
Plataformas: Facebook Messenger, WhatsApp e Twitter
Linguagens: Voz e texto
ITAÚ
Tipos de bot: Informacional e transacional
Eficiência: Mais de 80% das conversas são resolvidas sem que o cliente precise procurar outro canal do banco
Plataformas: Site, aplicativo, Facebook e WhatsApp
Linguagens: Voz e texto
BRADESCO
Tipos de bot: Informacional e transacional
Eficiência: Mais de 72 milhões de interações com usuários e redução de 50% da necessidade de atendimento humano
Plataformas: App, WhatsApp, Facebook Messenger e Google Assistant
Linguagens: Voz e texto
CAIXA
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: Capacidade para 1.200 atendimentos simultâneos
Plataformas: App e Google Assistant
Linguagens: Voz e texto
NEON
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: Resolve 30% de todas as demandas e é capaz de responder 90% das dúvidas
Plataformas: Chat do aplicativo
Linguagens: Texto
TV E TELEFONIA
SKY
Tipos de bot: Informacional e transacional
Eficiência: Tempo de atendimento até 40% menor
Plataformas: Contact center, app e siter
Linguagens: Voz e texto
VIVO
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: Resolve 80% de todas as demandas e tem nível de satisfação superior a 90%
Plataformas: App, telefone, Facebook Messenger, Google Assistant, WhatsApp e site
Linguagens: Voz e texto
NET
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: Participa de quase 100% dos atendimentos
Plataformas: Site e app
Linguagens: Voz e texto
SAÚDE E SEGUROS
HOSPITAL ALBERT EINSTEIN
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: 5.300 respostas por mês, com 750 usuários únicos e first call resolution de 51%
Plataformas: Site
Linguagens: Texto
HOSPITAL ALBERT EINSTEIN
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: 5.300 respostas por mês, com 750 usuários únicos e first call resolution de 51%
Plataformas: Site
Linguagens: Texto
PORTO SEGURO
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: Mais de 50 mil atendimentos por mês e ampliação do horário de atendimento para 24 horas
Plataformas: Site
Linguagens: Texto
SULAMÉRICA
Tipos de bot: Informacional e transacional
Eficiência: Resolve 80% de todas as demandas
Plataformas: Contact center
Linguagens: Voz e texto
INDÚSTRIA
WHIRLPOOL
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: 2 mil atendimentos por mês no Facebook e 120 mil chamadas por mês no call center
Plataformas: Facebook Messenger e contact center
Linguagens: Voz e texto
NESTLÉ
Tipos de bot: Informacional
Eficiência: 200 mil atendimentos extra no ano
Plataformas: Chat, Messenger e WhatsApp (em teste)
Linguagens: Voz e texto
FCA
Tipos de bot: Informacional e transacional
Eficiência: Não divulga
Plataformas: Site e SMS
Linguagens: Texto

Além de acelerar e ampliar o atendimento, os bots também serão fundamentais na construção de um banco de dados amplo e de fácil acesso. “Diferentemente de um contact center, quando eu interajo com um robô a informação sobre aquele atendimento não se perde. Toda a conversa se transforma em insights para novos produtos, novos serviços. Além de melhorar a eficiência operacional, passo a conhecer muito mais meu cliente final. Isso vai ter um impacto enorme na maneira como a gente faz pesquisa de mercado, pois tudo acontecerá em real time e on-line”, garante Dias.
Diretora de Serviço de Atendimento ao Cliente do Itaú Unibanco, Andrea Carpes destaca a evolução dos bots para assuntos recorrentes, como informações sobre cartão de crédito e conta-corrente. “Hoje, mais de 80% das conversas são resolvidas pelos bots”, revela. Para Andrea, os robôs de atendimento ajudarão o banco a construir interações cada vez mais personalizadas. No app do Itaú, os clientes podem interagir por voz e por texto. Na internet e nos canais externos, como Facebook e WhatsApp, somente por texto. “Já estamos considerando novos formatos, como video bots. Sempre monitoramos o comportamento dos usuários para entender qual tipo de interação faz mais sentido em cada canal”, diz Andrea.
Já o Banco Neon está procurando maneiras de colocar vídeos e GIFs para atender o consumidor em sua plataforma automatizada. O bot do Neon tem informação suficiente para responder a 90% de todas as dúvidas, porém, seu uso tem sido limitado a 30%, já que o banco ainda prioriza o contato humano. Product Owner do Neon, Breno Miranda afirma que a fintech vê os bots como suporte ao atendimento humano. “O chatbot tem um custo operacional 20% menor na comparação com as soluções tradicionais de atendimento e trazem maior agilidade na hora de sanar dúvidas básicas, permitindo que os geeks (nome dado aos atendentes da Neon) foquem asssuntos mais complexos.”
Na Caixa Econômica, a utilidade do bot tem-se restringido à divulgação de resultados de loteria. A novidade é fruto de uma parceria com o Google. “A Caixa é o único parceiro da América Latina a participar do projeto. Hoje temos mais de 5.900 usuários ativos, com 96% de satisfação”, afirma o diretor de Tecnologia da Informação da Caixa, Naran Peçanha. Em contrapartida, o bot do Google passa a aprender melhor o Português (segundo idioma mais usado no Google Assistant) para aprimorar sua inteligência artificial.
“O CHATBOT PERMITE QUE OS GEEKS (NOME DADO AOS ATENDENTES DA NEON) FOQUEM ASSUNTOS COMPLEXOS”
BRENO MIRANDA, PRODUCT OWNER DO NEON
BOTS EM AÇÃO
Na área de saúde, a Porto Seguro Saúde enxerga, nos bots, a oportunidade de liberar os atendentes para tarefas mais complexas. “O atendimento automatizado é usado para atender a três demandas principais: consultas de baixa complexidade, processos de negócios que podem ser facilmente documentados e vendas”, revela Sonia Rica, diretora de Atendimento ao Cliente da Porto Seguro.
Enquanto isso, o Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, lançou, no fim do ano passado, um bot de cuidados e tratamentos, que orienta os pacientes no pré e no pós-operatório. “Hoje, contamos com o bot para orientar pacientes que passaram por traqueostomia. O próximo será voltado a dicas de aleitamento materno e cuidados com o bebê”, adianta Claudia Laselva, diretora de Operações e de Enfermagem do Albert Einstein. Com o bot de atendimento, o hospital consegue atender 750 usuários únicos com um First Call Resolution de 51%, em média. São cerca de 5.300 respostas por mês.
E assim como no setor de saúde, o de mobilidade urbana ainda está dando os primeiros passos rumo à automatização do atendimento. Os motivos da cautela, no entanto, são outros. Enquanto o setor de saúde tem estruturas tradicionais que tornam a modernização mais lenta, as empresas de mobilidade ainda estão consolidando suas operações e têm outras prioridades no horizonte. A operação da 99 no Brasil, por exemplo, ainda não utiliza bots. Mas na China, a Didi Chuxing, controladora do aplicativo de transportes, recebe solicitações de ajuda via app e dá sugestões ao usuário baseadas em seu perfil. Diretor de Relacionamento com o Cliente da 99, Caio Poli diz que o potencial dos bots de entender o histórico de uso dos consumidores já está sendo estudado. “Hoje, a qualificação do atendimento é feita por amostragem. Os bots poderiam nos ajudar fazendo isso de forma automatizada, informando, inclusive, um score baseado em premissas predefinidas”, sugere.
Na Sky, cabe aos bots a hercúlea tarefa de negociar dívidas de clientes e resolver problemas técnicos. “Eles podem – e devem cada vez mais – ser utilizados para a realização de atividades menos complexas, repetitivas ou com roteiros predefinidos, deixando para o operador as demandas que requerem maior análise, argumentação ou merecem um tratamento diferenciado”, afirma Edison Kinoshita, vice-presidente de Banda Larga e Clientes da Sky. O agente virtual da Sky é capaz de realizar diagnósticos, vender planos de assistência técnica, atualizar o sinal do cliente e agendar uma visita técnica quando necessário. Além de tornar o atendimento até 40% mais rápido, o robô ajuda a reduzir custos. Segundo Kinoshita, a solução tem um custo aproximadamente 30% inferior a um atendimento tradicional. A proporção tende a ser ainda maior com o avanço da tecnologia.
OUÇA OS ÁUDIOS ENVIADOS PELA BLUELAB COM A INTERAÇÃO DOS BOTS DA SKY
“HOJE, A QUALIFICAÇÃO DO ATENDIMENTO É FEITA POR AMOSTRAGEM. OS BOTS PODERIAM NOS AJUDAR FAZENDO ISSO DE FORMA AUTOMATIZADA”
CAIO POLI , DIRETOR DE RELACIONAMENTO COM O CLIENTE DA 99
Apesar dos avanços da Sky, o setor ainda recorre aos robôs mais para resolver etapas informacionais do atendimento. É o caso da Vivo, que faz 1,5 milhão de atendimentos por mês com a Aura (disponível no aplicativo, no Facebook Messenger, no Google Assistant, no WhatsApp, no website e no contact center). A solução dá informações sobre o consumo de dados, segunda via de faturas e consulta sobre pacotes e consegue atender, sozinha, 80% desse tipo de demanda. Para monitorar a eficiência do robô, a Vivo montou um centro de treinamento de bots. “A Aura foi lançada em fevereiro do ano passado, de forma escalonada e cuidadosa, para garantir a melhor experiência de nossos clientes”, explica Luiz Medici, diretor de Big Data e 4ª Plataforma da Vivo.
No Grupo Claro, a tecnologia também se posiciona na camada informacional. Os clientes NET conseguem tirar dúvidas com o bot no site e no aplicativo Minha NET. Mas ele ainda não é usado para problemas mais complexos. “Todas as atividades repetitivas, rotineiras e que demandem menos ações específicas serão o foco de atuação dos bots”, diz Celso Tonet, diretor de Atendimento e Call Center do Grupo Claro.
Assim como a Claro, a TIM usa os robôs para funcionalidades comuns, como informar saldo, segunda via de fatura, mas também usa a inteligência artificial para auxiliar seus técnicos de campo. A tecnologia ajuda os agentes, que fazem melhorias na rede, a diminuir o tempo de atendimento e aumentar a eficiência. “A TIM reconhece que o principal benefício da utilização do bot é a conveniência oferecida ao cliente, já que permite o acesso a informações e serviços, digitalmente, sem a necessidade do atendimento humano”, afirma Marco Barbosa, diretor de Experiência do Cliente da TIM Brasil.
Eduardo Peixoto, chefe de Negócios do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (CESAR), que estuda como é aplicada e gerenciada a inovação no Brasil, não tem dúvidas de que os bots vão otimizar os processos de relacionamento entre pessoas e empresas. Mas diz que ainda estamos longe de termos bots substituindo efetivamente a atividade de pessoas. “Para fluxo de operações predeterminadas eles funcionam bem, mas, para outras demandas, eles ‘quebram’”, avalia.
A CONSTRUÇÃO DA MENTE ARTIFICIAL
O desenvolvimento dos bots exige que as empresas de tecnologia busquem no mercado mentes privilegiadas em diferentes áreas. A tarefa tem contado com designers, programadores, especialistas em processamento de linguagem natural e testes automatizados, e até mesmo jornalistas e psicólogos, incumbidos de criar uma linguagem mais empática para as máquinas.
Porém, o processo de construção de um bot começa bem antes da programação ou da definição da linguagem. A pesquisa de campo é a primeira etapa. Os profissionais precisam entender as necessidades do cliente e ter em mente como é o fluxo de trabalho de quem realiza os atendimentos. “Este é um processo de imersão, uma fase de descoberta para entender como funciona a operação e tentar não transformar o robô numa réplica do que seria o atendente”, explica Marcelo Noronha, UX Designer da Mutant.
Ao entender o fluxo de trabalho do cliente, os desenvolvedores conseguem definir os canais de aplicação do robô, seu nível de interação e o grau ideal de aprendizagem. “Uma solução de chatbot envolve muito mais do que a simples automação de respostas”, afirma Eduardo Guerreiro, diretor de Negócios Digitais da Cognizant no Brasil. Depois da imersão, o fornecedor reúne uma equipe especializada em experiência do cliente para definir a persona do bot – gênero, personalidade e até tom de voz e aparência. Feito isso, são criadas demonstrações genéricas de diálogos que mostram pela primeira vez a “cara” do bot. O próximo passo é criar todos os caminhos possíveis de diálogo, etapa que define como o bot vai reagir a qualquer fala de quem está do outro lado. Dependendo do cenário, é possível criar, ainda, uma resposta ao silêncio para chamar a atenção da pessoa que conversa com a máquina.
Após a aprovação, o desenvolvedor precisa gravar os diálogos. Segundo Noronha, a biblioteca de diálogos pode ter até 300 horas de gravação apenas na primeira parte do processo. “Na verdade, os processos duram muito mais, porque vão sofrendo alteração com o tempo”, explica o especialista. Quando o fornecedor tem a biblioteca pronta e aplica a solução em um contact center, website, aplicativo ou chat de uma rede social, os diálogos são armazenados em nuvem. O robô libera cada fala conforme escuta o consumidor, ou conduz o diálogo com perguntas e solicitações de fornecimento de dados.
Na visão de Guerreiro, é um erro tratar a utilização de chatbots como uma simples instalação de ferramenta, sem um processo de análise. “Sem a manutenção e evolução necessária e contínua, a tendência é que as ferramentas entrem em ociosidade e, consequentemente, em desuso”, afirma.
“SEM A MANUTENÇÃO E EVOLUÇÃO NECESSÁRIA E CONTÍNUA, A TENDÊNCIA É QUE AS FERRAMENTAS ENTREM EM OCIOSIDADE E, CONSEQUENTEMENTE, EM DESUSO”
EDUARDO GUERREIRO, DIRETOR DE NEGÓCIOS DIGITAIS DA COGNIZANT NO BRASIL
PENSAR E FALAR COMO UM HUMANO
CEO da Plusoft, Solemar Andrade destaca que houve uma aceleração do desenvolvimento dos bots de cinco anos para cá devido à evolução dos algoritmos de inteligência artificial e da linguagem natural. Mas concorda que, apesar da evolução, o mercado ainda oferece soluções de baixa complexidade. “Temos um volume muito maior de provedores que fazem bots mais simples, que chamamos de bots de circuito fechado. O outro bot, o transacional, precisa ter curadoria”, diz ele. “É preciso ter um engenheiro de conhecimento capaz de organizar os processos, fazer o tuning (ajuste) no conhecimento e na resposta. Todo dia esse cara tem que abrir o cockpit e ver o que o robô vem respondendo bem e o que não. E esse tipo de profissional não se forma em escola técnica”, afirma Andrade.
Segundo o executivo, o trabalho de curadoria das informações que serão implementadas no bot é o que vai iniciar a transformação da máquina de mera fonte de informação para um bot transacional. “Começa então a fase de derivações do conhecimento, que acaba por preencher o cérebro do robô com as soluções que se espera que ele alcance em níveis mais profundos. Essas informações serão organizadas e acessadas por algoritmos de busca e de respostas. Isso é mais complexo, pode estar integrado com sistemas da empresa, com uma base de dados secundária ou com bots mais sofisticados”, explica.
Uma das clientes da Plusoft é a Whirlpool. A empresa de bens de consumo emprega os bots desde 2017 para solicitar visita técnica em instalações, conversões de gás, reparos, remoções e reversões de porta dos seus produtos. “O consumidor ainda percebe o canal tradicional como o mais efetivo. Entretanto, esse número tem diminuído em função do crescimento das interações on-line e acreditamos que ainda há muita oportunidade de digitalização”, diz Roberta Donato, diretora de Serviços e Atendimento ao Consumidor da Whirlpool.
Na Nestlé, o bot desenvolvido pela Plusoft atua no pré e no pós-venda. “Definimos que, quando se tratar de um tema mais sensível, o contato é direcionado para o atendimento, reduzindo o tempo de espera”, explica Keila Paulina, head de Atendimento ao Consumidor da Nestlé Brasil. Apesar de os bots usados pela Nestlé e pela Whirlpool não explorarem todo o potencial dos robôs, eles já têm trazido resultados efetivos. Na Whirlpool, 30% das interações são resolvidas pelo atendimento automatizado. Já na Nestlé, os bots filtram, em média, 200 mil contatos por ano.
A EVOLUÇÃO DOS BOTS
Hoje em dia, a grande dificuldade de um bot não é responder, mas sim identificar uma pergunta das mais variadas formas como ela é feita. “A gente tinha um bot com cerca de 350 perguntas para 350 respostas. No fim de um ano e meio, ele acumulava cerca de 3.800 perguntas para praticamente a mesma quantidade de respostas”, conta Solemar Andrade, CEO da Plusoft. A seguir, ele lista as cinco etapas iniciais de desenvolvimento dos robôs de atendimento
Etapa 1: Respostas simples para perguntas simples
O robô começa a entender perguntas
Etapa 2: Experiência e aferição
A partir do ganho de experiência ele passa a sugerir soluções
Etapa 3: Construção de padrões
O robô começa a identificar perguntas e dar possíveis respostas
Etapa 4: Reconhecimento por voz
As variáveis semânticas aumentam e tornam possível identificar perguntas mais complexas
Etapa 5: Integração com outros sistemas
O bot passa a acessar sistemas legados ou mesmo o cérebro de outros bots

Renato Leite, engenheiro de Soluções do Google Cloud
O CÉREBRO ASSOCIATIVO
Outra empresa preparada para atender ao aumento de demanda por atendimento automatizado no Brasil é a Bluelab, que desenvolveu o BrainBot, robô que, segundo a empresa, realiza mais de 3 milhões de contatos mensais e é capaz de reduzir em até cinco vezes o tempo de atendimento. Para construir um “cérebro associativo” mais eficiente, a Bluelab lança mão do classificador semântico, que permite ao robô, por meio da identificação das palavras, entender por que o cliente está ligando ou mandando mensagem. “Esse classificador já está atrelado a três bibliotecas ou dicionários semânticos; um da empresa, um específico do setor e outro da Língua Portuguesa. As expressões equivalentes já estão cadastradas e, por isso, o robô sai de um ponto inicial muito mais avançado”, garante Mateus Baumer, sócio da Bluelab.
Alguns bots, como o dele, são construídos a partir de console próprio. Outras empresas constroem seus robôs em plataformas de grandes empresas de tecnologia, como Microsoft, Amazon e Google. A primeira, por exemplo, tem a Cortana, plataforma usada por mais de 1 milhão de desenvolvedores em 60 países para criar aplicativos capazes de fazer coisas até pouco tempo reservadas a humanos, como conversões de fala em texto, legendas para vídeos e até reconhecimento de gestos. “Ela permite que desenvolvedores criem habilidades específicas da empresa usando ferramentas conhecidas e confiáveis”, explica Maísa Penha, diretora de Tecnologia para Parceiros da Microsoft Brasil.
As empresas que constroem seus bots sobre a plataforma da Microsoft conseguem integrá-los a ferramentas como o Facebook Messenger, Slack e Skype. “A Microsoft assumiu um compromisso com a democratização da inteligência artificial e acreditamos que os bots têm um papel muito importante nessa jornada de aproximar a IA do dia a dia de pessoas e empresas”, conclui Maísa.
Já o Google Cloud está testando o “Contact Center AI”, um serviço que orienta os atendentes, fornecendo informações relevantes sobre o tópico em questão. O Dialogflow Enterprise, outra solução do Google Cloud, faz perguntas abertas para obter todos os dados de quem está ligando e, assim, agilizar o atendimento. Caso a ligação seja transferida para um atendente humano, o Dialogflow fornece todo o histórico da conversa. Renato Leite, engenheiro de Soluções do Google Cloud, afirma que mais de 800 empresas já se inscreveram para ter acesso à plataforma, ainda em fase de testes. “Essa forte resposta inicial mostra uma demanda do mercado por soluções que utilizem inteligência artificial de forma complementar ao talento humano”, afirma Leite.
“OS BOTS PODERÃO PREVER O QUE OS CLIENTES ESTÃO PROCURANDO E ENTENDER COMO OS USUÁRIOS ESTÃO INTERAGINDO EM CADA JORNADA DE RELACIONAMENTO”
ALEXANDRE THEODORO, DIRETOR DE TECNOLOGIA DA NEOBPO
AS DIFERENTES GERAÇÕES DE BOTS
A empresa de ERP Bluesoft qualifica os robôs de atendimento de acordo com a capacidade que eles possuem de entender a linguagem humana e replicá-la:
GERAÇÃO REATIVA: Funciona como uma espécie de buscador, como o Google, acoplado a um layout de chat. Opera por palavra-chave e consegue resolver até metade dos chamados sem a necessidade de transferir para um humano.
GERAÇÃO EVOCATIVA: Como possui memória contextual, não há necessidade de repetir as expressões ditas. Isso faz com que o robô consiga até 80% de retenção
GERAÇÃO COGNITIVA: Tem a capacidade de aprender sozinha na medida em que entende diálogos do contact center entre humanos. Ainda assim, precisa de uma quantidade significativa de diálogos para criar sua própria inteligência.
6 TENDÊNCIAS PARA O MERCADO DE BOTS
1. Os robôs deixarão de ser informacionais para se tornarem transacionais e consultivos
2. Os pontos de contato serão ampliados e o atendimento, cada vez mais personalizado
3. Eles devem substituir, com o tempo, os aplicativos
4. A previsão é de que invadam as redes sociais, que passarão a ter mais relevância no atendimento
5. Terão a missão de abastecer e organizar bancos de dados com informações que se perdiam na central de atendimento
6. Conseguirão prever demandas antes mesmo que elas sejam percebidas pelo consumidor

Aixa, a simpática assistente virtual da Caixa Econômica Federal
5 SINAIS DE UM ROBÔ MAIS HUMANO
Um dos sócios da Robocopy, startup holandesa que atua como uma consultoria especializada em projetar e desenvolver diálogos para chatbots, Hans van Dam desenvolveu, ao lado dos sócios, uma metodologia para avaliar o grau de humanidade de um chatbot com base em cinco critérios: personalidade, linguagem natural, empatia, utilidade e persuasão. “De todos esses elementos, o mais importante é a empatia. O grande erro dos chatbots de hoje é pensar que a informação pura e simples basta para o consumidor”, diz ele. Confira:
1. PERSONALIDADE
Seu robô tem uma personalidade consistente?
2. LINGUAGEM NATURAL
Ele fala de maneira natural ou tem aquele tom metálico?
3. EMPATIA
O bot está pronto para entender os objetivos do seu cliente?
4. UTILIDADE
Ok, ele já entendeu as necessidades do cliente. Mas ele está resolvendo?
5. PERSUASÃO
Seu robô é capaz de convencer o consumidor a levar a conversa até o fim?

Equipe de desenvolvimento de bots da Cognizant
O FUTURO DOS BOTS
Diretor de Tecnologia da Neobpo, Alexandre Theodoro aposta na rapidez dos bots para popularização do serviço daqui em diante. E vê a ascensão dos robôs como algo certo. “Os bots poderão prever o que os clientes estão procurando e entender como os usuários estão interagindo em cada jornada de relacionamento”. Para o executivo, a velocidade de resolução deve ajudar principalmente setores como o varejo. “A capacidade de resolver problemas antes que eles surjam tem um enorme potencial. Isso poderá reduzir significantemente as taxas de abandono no ciclo de compras”, avalia.
O uso dos bots para além do atendimento e marketing também deve ser uma das forças dessa nova tecnologia, segundo Cristiano Barbieri, diretor de Estratégia Digital, Inovação e Tecnologia da SulAmérica. “A tendência é que os bots ganhem maturidade cada vez maior em atividades de processamento e gerenciamento de big data, o que deve resultar em novos produtos e serviços ao consumidor”, diz Barbieri. Ele explica que a capacidade preditiva dos robôs permite surpreender o cliente com informações adicionais. Isso, claro, a partir de uma análise do seu histórico. Para Cristiane Paixão, diretora-adjunta de Customer Care da Fiat Chrysler Automobiles (FCA) para a América Latina, isso já acontece na prática. “O próprio cliente, através da busca, nos auxilia na tomada de decisão e oferta de novos serviços, nos permitindo um aprendizado contínuo”, explica.
“ALGUNS BOTS SERÃO IGUAIS AOS USUÁRIOS EM COMPORTAMENTO; OUTROS ASSUMIRÃO UM PAPEL SUPERIOR, E HAVERÁ AINDA AQUELES QUE SERÃO SUBMISSOS”
HANS VAN DAM, DIRETOR-GERAL DA ROBOCOPY
Diretor-geral da Robocopy, empresa holandesa que escreve diálogos para assistentes de voz, Hans van Dam faz uma ressalva: mais do que tornar os robôs eficientes, é preciso conferir a eles personalidade. E isso se dá desde o tom de voz ideal para gerar empatia ao fato de alternar a voz do bot durante o atendimento para dar a sensação de que mais de uma pessoa está trabalhando para ajudar na resolução do seu problema. “É preciso pensar sobre como o bot se relaciona com o usuário e seus objetivos. Alguns bots serão iguais aos usuários em comportamento; outros assumirão um papel superior, e haverá ainda aqueles que serão submissos. Obter a relação psicológica entre o bot e o usuário ajudará a criar uma experiência eficaz e que agregue valor”, prevê Dam. Os desafios são muitos – e complexos –, mas todos os esforços caminham para que robôs, atendentes e clientes, de algum jeito, passem a falar a mesma língua.